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Thomas Woods refutado

Atualizado: 13 de fev. de 2023

Caso você acompanhe com certa frequência os posts do blog, vai se lembrar de um post denominado "É preciso ser cristão para ser bom?" e outro chamado "Cristianismo a religião da paz?" , em ambos me propus a refutar alguns argumentos de apologistas que distorcem a história com o objetivo de vender uma narrativa pró Igreja e passar pano para as atrocidades cometidas por ela, por vezes usando tais argumentos para defender um estado confessional teocrático e católico. No entanto, creio ser necessário um terceiro post sobre esse tema, já que recentemente descobri um livro amplamente citado pelos apologistas chamado "Como a Igreja Católica construiu a civilização ocidental" do autor Thomas Woods, e devido a frequência com que é citado creio ser necessário um post só para ele e refuta-lo de uma vez. Pois bem, sem mais delongas vamos logo aos argumentos de Woods.


> A Igreja e o civilização dos pagãos;


Woods parece querer reescrever a história cronologicamente do ponto de vista de alguém fanático que acredita que a Igreja construiu a civilização Ocidental, e inicia sua argumentação um pouco após a queda do Império Romano do Ocidente. Para ele a primeira grande contribuição da Igreja foi a conversão dos bárbaros, que seriam um povo atrasado, com leis e modo de vida selvagem e arcaico, e a contribuição da Igreja nesse momento foi civilizar esses povos. Sabemos hoje que essa é uma visão no mínimo preconceituosa, idealizada do ponto de vista romano, mas mesmo ignorando isso devemos destacar dois pontos: O primeiro é que o Cristianismo era a religião oficial do império a pouco tempo (pelo menos historicamente falando). Vejamos, ele se tornou a religião oficial do Império Romano em 380 d.C e ele caiu em 476 d.C, ou seja são menos de 100 anos de governo cristão, pouco tempo para analisar se esse novo governo seria tão mais civilizado assim que os bárbaros ou se é só hipocrisia típica de estados conquistadores. Para piorar, apesar do pouco tempo de existência do cristianismo como religião oficial do Império tivemos um período marcado por perseguição a outras religiões pagãs e pela primeira vez uma proibição oficial do estado, dando fim a liberdade religiosa.


Sim, pois caso não saibam apesar da perseguição aos cristãos por muito tempo, ele nunca havia sido legalmente proibido pelo Império Romano, salvo breves momentos no governo de Décio e Valeriano entre 250 d.C e 260 d.C, e com o Édito da Perseguição de Diocleciano entre 303 d.C e 311 d.C, o que comparado aos mais de 400 anos de existência de cristãos no Império Romano mostra que tais políticas são exceção e não regra. Como Bart Ehrman conta em "O que Jesus disse e o que Jesus não disse", não era proibido que cristãos seguissem suas crenças no Império romano, porém eles eram socialmente mal vistos por serem uma religião nova, que nem seguiam os deuses romanos e nem as diferentes divindades já existentes, como o judaísmo. Eles eram vistos como uma espécie de seita judaica mas que não seguia os preceitos judaicos. Assim eles tinham antipatia dos dois lados e eram acusados de irritar os deuses por isso, quando haviam grandes desastres naturais, fomes, pragas, inundações os cristãos eram culpados e perseguidos, por vezes até por agentes estatais mas não havia nenhuma lei oficial proibindo o cristianismo. Ao contrário disso, quando o cristianismo foi tido como religião oficial do Império, houve de fato leis proibindo o paganismo e os perseguindo sistematicamente a ponto de uma das três grandes destruições da Biblioteca de Alexandria ter sido motivada por um bispo chamado Teófilo, que mandou destruir a Biblioteca por associação ao paganismo, além de destruir o prédio que abrigava a figura do deus Serápis . Até mesmo com os judeus houve perseguição, com eles sendo proibidos de praticar advocacia, se casar com cristãos, proibidos de servir ao exército e ocupar cargos administrativos. A sorte desses últimos é que estavam sob status de religio licita, ou seja estavam dotados de direitos que não podiam ser revogados. Ou seja, em pouco tempo de existência a Igreja foi marcada por perseguição religiosa, algo que se manteve aos longo dos séculos até mesmo na conversão dos povos pagãos do resto da Europa, vide o massacre de Verden em 782 d.C. Ou seja, do ponto de vista de liberdade religiosa houve retrocesso nos primeiros séculos da Igreja Católica.


Por fim devemos lembrar que mesmo assumindo que a Igreja tinha preceitos mais civilizados que os pagãos não foi a Igreja que os iniciou. Sim, pois do jeito que Woods descreve em seu livro parece que a Igreja havia criado o estilo de vida civilizado e baseado em instituições, quando na verdade o recebeu pronto dos romanos que já eram assim durante séculos, a Igreja teve apenas de repassar aos povo germânicos. Se tivesse que dar o mérito a alguém por isso é maior mérito aos romanos, esses sim romperam com a ordem social vigente na época deles e criaram um modelo que vai contra o que vigorava no mundo antigo, a contribuição da Igreja nesse sentido foi bem menor do que Woods tenta alegar. E até nisso em vários momentos houve retrocesso, de modo que só podemos falar em de fato início do pensamento humanista com o iluminismo.


> A Igreja e a educação;


Woods cita a participação de Carlos Martel e Carlos Magno na Renascença Carolíngia, e como essa fase teria contribuído para a educação na sociedade ocidental. Há vários problemas com essa análise. Primeiramente, apesar de ter havido um avanço na área da educação de fato, ela ficou limitada a pequenas parcelas da população, como monges e alguns nobres, que já detinham o conhecimento na época. O resto da população continuou analfabeta e assim se manteria por séculos. O fato de ter havido alguma contribuição não significa que a Igreja construiu a civilização ocidental, pois contribuição por contribuição sempre existiu na história da humanidade. Bart Ehrman já citou Atenas do período clássico como sociedade que havia incentivo a leitura, apenas dar uma contribuição não significa construir o ocidente a menos que sua contribuição seja muito discrepante das anteriores e posteriores, e nesse caso falando de revolução na educação não há nada como o renascimento do século XI e XII. Além disso quem promoveu tal revolução foi Carlos Magno e não a Igreja, onde entra mérito da Igreja nessa história? O fato dele ser um rei cristão joga os méritos para Igreja? Ou o fato da Igreja ter apoiado ele? Se for assim quando um cristão fizer alguma guerra ou genocídio entram na conta da Igreja também, mas isso os cristãos negam até a morte. O autor cita o fato de monges terem preservado obras após destruição por invasões principalmente dos vikings, e que se fosse como os gregos quando sofreu uma invasão dos dórios muito teria se perdido, o que é importante mas não devemos esquecer de várias vezes que o contrário ocorreu, a Igreja destruiu obras, estátuas e até bibliotecas, como a de Alexandria, que levou a morte de Hipátia, da Biblioteca Real de Antioquia que foi destruída em 363 DC pelo Imperador Cristão Jovian.


O livro "A Chegada das Trevas Como os Cristãos Destruíram o Mundo Clássico" de Catherine Nixey, mostra como os monges destruíam obras históricas, fazendo a raspagem dos pergaminhos de obras clássicas para usar para escrever obras bíblicas por cima. Exemplos não faltam, como a substituição da última edição de "Da República" de Cícero para registrar seus comentários sobre os Salmos, uma obra biográfica de Sêneca desapareceu sob outro antigo, um códice com as Histórias de Sallust deu origem a mais escritos de São Jerônimo, a obra de Demócrito, um dos maiores Filósofos gregos e pai da teoria atômica, se perdeu, além de obras de Plínio, Plauto, Cícero, Sêneca, Virgílio, Ovídio, Luciano, Tito Lívio e muitos mais, todos foram raspados e apagados por mãos dos monges. E mais outros tantos textos foram perdidos por ignorância, desprezados e ignorados, ao longo dos anos. Monges participaram de destruição de estátuas na Síria. No final, nesse ponto fica equivalente.


Sobre os monges terem contribuído para a agricultura, aqui entra o mesmo erro da análise na educação, pois há apenas pequenas contribuições que de fato melhoraram a agricultura. mas nada se compara a revolução do neolítico e a da Inglaterra no século 18 e 19. Dizer que a revolução na Inglaterra se deve ao que os monges fizeram é erro de aleatoriedade temporal, pois o conhecimento é algo contínuo, todos períodos tem suas contribuições , mas alguns são indiscutivelmente maiores que outros a ponto de serem estudados como marcos na história o que não é o caso da contribuição medieva na agricultura. Apenas associar a revolução na agricultura na Inglaterra a contribuição dos monges sem nenhum prova é errado, da mesma forma podemos associar o conhecimento dos monges a dos agricultores da Roma antiga, e esses aos povos anteriores a ele e assim por diante até o início da humanidade.


A mesma coisa para as contribuições na metalurgia, mesmo com algum grau tecnológico existindo entre os monges outros momentos históricos são mais marcantes, como a idade do ferro desde 1200 a.C, sendo na Europa iniciada na Península Ibérica desde 1000 a 900 a.C e no norte da Europa por volta de 700 a.C. Ali sim houve uma revolução na produção do material que mudou os rumos da história em relação ao que se tinha antes, na Idade Média não. Tanto que até o final dos anos 700 o ferro continuou a ser um item raro devido a limitações tecnológicas da época e ainda de menor qualidade, por ser mais comum usar o ferro forjado que era mais maleável ao passo que o ferro fundido que seria desenvolvido depois era mais resistente e barato. Algumas inovações da Idade Média nesse sentido que merecem destaque são a forja catalã, do século IX e XI, que se baseava na utilização de um cadinho e um recurso ao carvão de madeira e ao ar, para a obtenção do ferro, a partir do respectivo minério, um processo que levava de 4 ou 5 horas e não se obtinham mais de 30 a 40 kg de ferro. Tínhamos também a técnica do forno-alto do século XI-XII que utilizava energia hidráulica para acionar foles mecânicos que permitiam manter a temperatura elevada acima do ponto de fusão do ferro, possibilitando a produção de ferro moldado de várias formas.


Porém nem ela foi inventada elos monges, mas sim pelos chineses em 6 a.C. No entanto nada disso teve grande impacto no seu tempo, pois a produção continuava baixa e a próxima revolução na obtenção desse material só se daria no século XVIII com o forno de Abraham Darby I, em Coalbrookdale (Grã-Bretanha), que foi capaz de produzir ferro utilizando carvão de pedra, algo abundante em países como Inglaterra e Alemanha e libertava a produção de ferro das florestas. Associado as máquinas a vapor esse sim foi um momento de revolução da produção do material. Na verdade boa parte desse ponto de Woods é sobre uma suposta estrutura dos monges que talvez pudesse produzir ferro fundido em larga escala mas que devido a Henrique ter fechado os monastérios eles não conseguiram. Isso é completamente irrelevante pois é um exercício de futurologia, sobre a tecnologia que de fato se tinha, a história é bem diferente.


Ele cita também a criação de escolas pela Igreja através de reuniões locais, como o sinodo na Baviera (798), o Concílio de Chalons (813) e Aix (816), mas não explica o contexto histórico e a resistência da Igreja em permitir o ensino para leigos. As primeiras escolas como essas se abriram junto a catedrais e seus alunos eram em sua maioria jovens que se preparavam ao sacerdócio ou que ainda estavam se decidindo sobre. Isso inclusive explica a diferença brutal de alfabetização entre homens e mulheres na época. Ou seja o ensino era voltado a manter o status quo de até então: o conhecimento monopolizado pela Igreja, e não uma criação das escolas públicas ou um passo nessa direção. Tanto que já em 817 o imperador Luís o piedoso define que o ensino deveria se limitar para oblatos (pessoas ligadas a Igreja). Para ser honesto até houve em certo momento a liberação da Igreja de alfabetizar leigos principalmente na Itália em cidades como Turim, Pavia, Cremona, Florença, Fermo, Vicenza, Cividale e Ivrea, liberadas pelo imperador Lotário em 825. Mas além de leigos não ser o povo em geral, mas sim nobres aspirantes à carreira eclesiásticas, logo essa política foi mudada e em um Concílio romano de 853 o papa Leão IV, reafirma que as escolas nas sedes episcopais são reservadas aos clérigos. No fim, venceram os defensores do ensino extremamente restrito a uma parcela ínfima da população, e não a toa até o ano de 1475 as taxas de alfabetização na Europa medieval eram bem baixas, com no máximo 15% de alfabetizados na Itália, 10% na Bélgica, 9% na Alemanha, 6% na França e 5% no Reino Unido. Esse era o modus operandi da Igreja católica em relação a educação, não a toa também que após a reforma protestante, a Itália (que permaneceu com grande influência católica em detrimento dos outros citados) passou de um dos melhores nesse quesito para um do piores, visto que já em 1650 a Itália apresentaria taxa de alfabetização de 23% contra 53% do Reino Unido, 31% da Alemanha, 29% da França e 25% da Bélgica. Pesquisadores como José Brissos Lino, concordam que a reforma protestante mudou o paradigma da educação e foi importante para estimular a educação no norte da Europa. Ou seja, muito mais do que não ajudar na educação da população a Igreja trabalhou pró manutenção de seu monopólio do conhecimento.


Outros pontos citados por ele como a produção de vinho e de relógios são bem irrelevantes, entram na categoria de pequenas contribuições comuns a todos os povos da história. Ainda sobre a educação e a Igreja Católica, Woods prossegue com supostas contribuições ao citar a escola de Chartres, novamente uma escola catedral, voltada apenas para monges e por vezes filhos de nobres, como era comum nas escolas medievais. Aliás sobre os filhos de nobres nas escolas medievais, o objetivo de inclui-los na educação não era ampliar a parcela da população alfabetizada, mas sim objetivo político, de trazer a elite para dentro da Igreja, ter mais pessoas dentro da elite com os pensamentos ideológicos próximos aos interesses da Igreja. Com o advento da burguesia a demanda por escolas aumentou e como a educação se dissipou para a população de modo independente da Igreja, só veríamos uma educação realmente disseminada pela população e em altos graus de alfabetização com a Reforma Protestante, pois foi Lutero quem impulsionou a força política à programação de um novo sistema escolar e difundiu a necessidade da escola chegar as classes populares, para que cada sujeito pudesse ler as Sagradas Escrituras e interpretar a palavra não mais submetido à Igreja Católica.


É importante notar as diferenças do que se tinha no Império Romano e na idade Média, com relação as escolas. No Império Romano já era comum existir as escolas coletivas, que ensinavam as matérias gerais para todos alunos independente de qual segmento social ele seguiria. Embora haja algumas críticas de até que ponto elas de fato alcançavam todo mundo ou se ficariam limitadas aos centros urbanos, a ideia é que todos poderiam e deveriam receber educação, com o estado romano tomando as rédeas e financiando a educação pública da população. Na Idade Média o que tivemos, como já vimos, foi uma educação limitada a monges e pessoas que seguiriam alguma carreira religiosa, com o resto da população não recebendo ensino formal. Qual dos dois modelos se parece mais com o atual? É difícil associar a Igreja a criação das escolas com esses fatos em mente.


Além de ser extremamente limitada a uma pequena parcela da população, a educação pela Igreja era extremamente controlada como já vimos e comprovada até pelo próprio Woods quando ele cita as Condenações de 1277 ao material de Aristóteles na Universidade de Paris por um bispo. Ao ser deparado com isso o autor tenta transformar o erro da Igreja em algo bom, pois segundo ele a partir disso os autores precisaram se desvincular de ideias erradas como a não existência de vácuo proposta por Aristóteles. Acontece que isso não faz o menor sentido, primeiro porque Aristóteles ter errado sobre o vácuo não faz dele todo errado, ele poderia estar certo em outros pontos e ninguém saberia porque não poderiam estuda-lo. Até onde se sabe ele foi o primeiro a descobrir que a Terra é redonda, por exemplo. Segundo que não é necessária uma censura para uma ideia errada ser refutada, a ideia do éter foi caindo em desuso e completamente descartada após vários experimentos não conseguirem detecta-lo. E da mesma forma que os cientistas da época tiveram que desvincular de uma ideia errada perderam a oportunidade de estuda-la para saber porque estava errada e esse conhecimento ajudar em outras teorias. Para piorar mais ainda sabemos hoje que a visão de Aristóteles não estava totalmente errada, o vácuo do espaço não é necessariamente o vácuo completo, já que flutuações quânticas e moléculas de hidrogênio bem espalhadas preenchem ele.


Já imaginou se um cientista da época descobrisse isso, mas não poderia publicar por ir contra a interpretação da Igreja de mundo? Será que se a evolução fosse descoberta na época poderia ser publicada mesmo indo contra a interpretação bíblica que os seres vieram prontos? Lembrando que a Igreja realmente brigou com a evolução por muito tempo justamente por causa disso, com inclusive o livro de Darwin indo parar no Index de livros proibidos. A sorte é que nessa época a Igreja já não tinha o poder político e não tinha poder para censurar tais obras e autores.


Não necessariamente irrelevante mas de importância menor é a parte em que Woods cita grandes nomes ligados a Igreja que também contribuíram para a ciência, sendo eles Roger Bacon, Alberto Magno, Roberto Grosseteste e Nicola Steno. Sobre Roger Bacon já falamos em outros posts, ele foi perseguido e preso por suas ideias que levaram ao método científico. Os outros citados, apenas Steno e Grosseteste eram diretamente ligados a Igreja, ou seja Alberto Magno entra na categoria já falada em outros posts e até nesse, que é tentar dar crédito a Igreja por feitos de pessoas aleatórias mas cristãs, o que é um critério bizarro mas se é o que eles querem nada podemos fazer, apenas apontar a hipocrisia de eles não aceitarem quando colocamos na conta da Igreja atrocidades cometidas por cristãos. E sobre Steno e Grosseteste, a Igreja detinha o conhecimento da época, é natural que de pessoas ligadas a ela virão as inovações da época. Porém, será que ela o fazia de modo eficiente? Nossa reflexão sobre o atraso da Itália Católica x Europa protestante e o atraso europeu em relação ao mundo muçulmano da época sugerem que não. Isso sem dúvida pesa muito mais que meia dúzia de pessoas que deram alguma contribuição científica.


O mesmo se atribui aos jesuítas. Sendo eles ligados a instituição que dominava a conhecimento na época é natural que deles tenham alguma contribuição científica. No entanto, por estarem ligados a Igreja estendiam seus preconceitos contra ideias científicas, como o atomismo e lutavam ativamente contra ela. Amir Alexander, importante historiador israelense e acadêmico que estuda as interconexões entre a matemática e seu cenário cultural e histórico, diz:


“Se os jesuítas e seus aliados tivessem feito o que queriam, não haveria cálculo, nenhuma análise, nem qualquer uma das inovações científicas e tecnológicas que fluíram de essas técnicas matemáticas poderosas.”


Ele diz isso ao falar sobre a luta contra a crença jesuíta de se opor que uma linha contínua é composta de partes distintas e infinitamente pequenas. O impacto da afirmação de Alexander é contestada por outros autores, que não negam que os jesuítas foram ativos na luta contra o atomismo, mas acreditam que haveria outras formas de fazer as descobertas matemáticas mesmo assim, mas já nos dá uma noção da ação dos jesuítas atrapalhando a ciência sempre que ela ia contra seus dogmas. É só importante falar que o citado por Woods, Boscovich que trabalhou com teoria atômica viveu em um tempo bem posterior ao da Inquisição e da censura da Igreja. No século XVIII a Igreja já estava perdendo poder de censura, então é natural que alguns autores se sentissem mais a vontade de falar sobre, não sendo assim no entanto dois séculos antes a ponto de poucos jesuítas e teólogos que se simpatizavam com a ideia do atomismo serem repreendidos, como Nicholas de Autrecourt que defendeu o atomismo e foi julgado e condenado pela Igreja em 1346, sendo obrigado a se retratar em público e teve suas obras queimadas. Mesmo a Igreja perdendo poder, não impediu que repreendesse autores como o português António Cordeiro, que em 1714 tentou conciliar o atomismo com o modelo aristotélico dos quatro elementos, descrevendo a luz como pequenas partículas de fogo e foi obrigado a se retratar e foi afastado dos ensinos.


Não há dúvida alguma da posição contrária dos jesuítas com relação ao atomismo e heliocentrismo, começa pelo autor da denúncia contra Galileu ser um padre jesuíta chamado Orazio Grassi. Além dele há vários outros jesuítas de destaque na luta contra o atomismo foram Inácio Vieira, António Vieira e Silvestre Aranha. Antonio Vieira era professor no Colégio de Santo Antão, em Lisboa, que atacou quem pretendia estudar a lógica por Descartes, Gassendo, Mariotte, Isaac Newton, por contrariar a boa teologia. Já Silvestre Aranha destacava-se no ataque ao atomismo, em seu livro “Disputationum Physicarum adversus Atomisticum Systema”, afirmou que o atomismo subvertia a ordem natural das coisas ao separar a filosofia da teologia. O atomismo foi literalmente banido das escolas jesuítas como mostra um decreto de 1746 do reitor do Colégio das Artes:


“[...] nos exames ou lições, conclusões públicas ou particulares se [não] ensine defesa ou posições novas pouco recebidas ou inúteis para o estudo das Ciências maiores como são as de Renato Descartes, Gassendi, Newton e outros, e nomeadamente qualquer Ciência que defenda os átomos de Epicuro ou negue a realidade dos acidentes Eucarísticos ou outras quaisquer conclusões opostas ao sistema de Aristóteles, o qual nestas escolas se deve seguir, como repetidas vezes se recomenda nos estatutos deste Colégio.”


Assim, por mais que Woods tente supervalorizar as contribuições científicas dos jesuítas o que fica claro é que a relação deles com a ciência era dúbia. Elas eram aceitas desde que não fossem contra as crenças cristãs. Assim volta a dúvida, será que se a evolução fosse descoberta nos tempos da Inquisição poderia ser ensinada?


> A Igreja e a ciência;


Já no início do livro, o Sr. Thomas Woods a partir da página 7 diz que a Igreja forneceu grande contribuição para a ciência, sendo que ela criou o sistema universitário e deu as bases para a revolução científica. Ele cita nomes importantes para a ciência que seriam sacerdotes como Nicolau Steno pai da geologia, Athanasius Kircher pai da egiptologia e Rogério Boscovich, o pai da teoria atômica moderna. Sobre isso basta conhecer um pouco de história e percebemos que apesar de ter certa contribuição isso não quer dizer muita coisa, afinal a Igreja monopolizava o conhecimento da época, então é natural que alguém que monopolize o conhecimento vá inovar mais que alguém que não tem. No entanto se comparado ao mundo muçulmano da mesma época os cristãos da Igreja ficavam bem atrás, e como veremos o mundo protestante cresceu academicamente bem mais que a Igreja devido a censura dela. Então apesar de alguma contribuição está bem longe de ser a grande provedora da ciência que Woods tenta vender.


Sobre a criação das universidades, já mostramos no post "Cristianismo a religião da paz?" que quem criou as universidades na verdade foram os muçulmanos, as 3 primeiras universidades do mundo foram Universidade Ez-Zitouna (737 d.C), Universidade al Quaraouiyine (859 d.C) e Universidade de Alazar (988 d.C), todas muçulmanas e que sim elas ensinaram conteúdo científico e não apenas teologia. Então os apologistas por vezes mudam um pouco o discurso, e dizem que na verdade a Igreja criou as universidades no ocidente, porém nem isso é exatamente verdadeiro.


Na verdade sobre as universidades na Idade Média, importantes medievalistas como Jacques Le Goff, já mostraram que a criação das universidades medievais está relacionada ao renascimento urbano e do comércio. Esse por sua vez está relacionado ao aumento populacional no campo e nas cidades, sendo essa segunda relacionada a pessoas recém chegadas do campo evadidas da servidão e a primeira a melhoras de técnicas agrícolas. Com o renascimento do comércio, especialmente pelo mar, teve-se início a chamada cultura de mercador, pois era necessário moedas para regular as transações comerciais. Pra saber lidar com essa nova forma de comércio foram sendo criadas escolas secundárias urbanas, as studium generale, que ensinavam leitura e matemática, como se vê em Gand desde 1179. Elas se multiplicaram independente da Igreja, através da burguesia através do século XII e foram a base para o surgimento das universidades, pois com o tempo formaram corporações e deram origem as primeiras universidades. Para ele isso proporcionou uma revolução nas formas de ensino, já que antes a igreja detinha o conhecimento, com essas escolas o conhecimento era democratizado. Ele não nega a influência da Igreja nos séculos posteriores a criação dela, citando inclusive os eclesiásticos, mas o que fica claro é que o surgimento delas foi bem mais dependente do comércio que de alguma ação da Igreja. Fica difícil dizer que sem a Igreja não haveriam universidades.


Ainda sobre a relação entre Igreja e ciência, já vimos em outros posts como a censura da Igreja atrasava a publicação de obras e com isso a divulgação do conhecimento. No entanto os efeitos de tal censura são bem mais danosos que se pode imaginar, como mostrou um estudo de Blasutto e Croix (2021), que mostrou o impacto da censura da Igreja na produção acadêmica e consequentemente até na economia na Itália. Os autores analisaram um autor da época e viram se ele foi alvo de censura ao longo dos anos e o impacto que a censura teve nas publicações.

Eles dividiram em 5 períodos de 70 anos ( 1400-1470, 1470- 1540, 1540-1610, 1610-1680, e 1680-1750), notando que de 1400-1540 (dois primeiros períodos) a produção de livros na Itália era superior a da Europa, caindo bastante no terceiro período (1540-1610) e torna-se muito grande no quinto período (1680-1750) e que o surgimento da lacuna coincide com o Index publicado pela Universidade de Paris de 1544 e o Index Librorum Prohibitorum de 1559.


Os autores observaram que o número total de publicações na Europa protestante (representada por França, Alemanha, Áustria, Inglaterra e Irlanda) superou a Itália católica, sendo as únicas regiões europeias a não superar a Itália foram Portugal, Espanha e nórdicos como Dinamarca e Suécia, sendo que no caso de Portugal e Espanha é justamente por causa da Inquisição agindo censurando obras. No quesito publicações por diferentes pessoas todas superaram a Itália católica menos Portugal e Espanha, os menores nesse quesito inclusive.


Nota-se que entre 1400-1470 a Itália tinha muito mais publicações de obras que o resto, sendo 197 para ela, seguido por 73 de Alemanha e Áustria, 55 da França, 17 de Portugal e Espanha, 12 de Grã-Bretanha e apenas 1 de Dinamarca e Suécia. Isso se deve a obviamente a Igreja deter o conhecimento da época e praticamente monopolizar a divulgação da informação. No entanto já entre 1680-1750 o número de publicações da Itália era de 589 (um aumento de 198%) mas da Alemanha e Áustria foi de 1997 (um aumento de 2635%), 861 na França (um aumento de 1400%) e 300 na Suécia e Dinamarca (um aumento de quase 30000%). Ou seja, se comparado a outras regiões da Europa houve sim uma estagnação na Europa.


O conteúdo censurado inclusive não era apenas obras heréticas, apesar que mesmo isso tinha impacto sobre obras científicas como mostrado no caso de Miguel Servet no outro post, na verdade conteúdo científico foi amplamente censurado, como aqueles sobre heliocentrismo e atomismo. Mesmo aceitando o heliocentrismo em um primeiro momento, em 1616 a tese foi vista como absurda pela Igreja e por mais de três séculos ficou no index de livros proibidos só sendo retirado em 1846. A crença do atomismo (ou seja a existência de átomos) também foi duramente censurada, sobrando para Descartes e Galileu, que foram censurados até pelo menos o século XVIII. Cerca de 12% dos conteúdos de ciências e 5% dos conteúdos de medicina eram censurados, o que pode parecer pouco se comparado aos mais de 50% das obras de humanidades, mas teve um impacto absurdo como veremos. Entre 1400-1470 cerca de 7% das obras totais eram censuradas pela Igreja, entre 1470-1540 tivemos o ápice com 11% das obras sendo censuradas e 8% entre 1540-1610. A partir daí os números foram diminuindo e chegou a 6% entre 1610- 80 e 4.92% entre 1680- 1750, muito mais devido a perda de capacidade de censura da Igreja que vontade ela.


Analisando os dados, os autores mostraram que se a tendência dos dois primeiros períodos se mantivessem, teríamos um aumento de 59% nas publicações de autores considerados revolucionários (ou seja com ideias que a Igreja era contra, o que incluía elementos científicos como heliocentrismo e atomismo) e não uma queda de 26% no número de publicações realmente observada. Considerando autores não só revolucionários como não revolucionários, tivemos uma queda de 30% nas publicações. A Igreja de fato usava de censura via ameaça, e o efeito dissuasor diminuía a possibilidade de pessoas publicarem sobre temas proibidos pela Igreja, vide que ela ameaçava tomar propriedades e até excomungar, prender e matar quem o fizesse. Por vezes a Igreja também censurava não muitos autores mas aqueles com maior qualidade, ou seja aqueles com maior número de publicações, o que reduz a oferta de autores para os revolucionários que se seguem e reduz as possíveis publicações de autores que discordavam da Igreja. Além do mais os autores mostraram que as publicações per capita diminuíram na Itália e aumentou no resto da Europa em várias áreas do conhecimento, como pode ver na tabela e gráfico abaixo:








Além do impacto na produção acadêmica, os autores mostram que essa censura foi uma das causas para o declínio italiano por reduzir capital humano. Ou seja longe da Igreja ser a criadora das universidades, a promovedora da ciência na Europa e a responsável pelo desenvolvimento econômico, a Igreja foi muito pelo contrário, na verdade ela atrapalhou a ciência e o desenvolvimento econômico da Itália, a região onde ela tinha mais influência e quem mais se desenvolveu foi quem estava longe dos domínios dela.


Dito isso fica difícil acreditar nas outras afirmações de Thomas Woods, que é quando ele cita outros autores que confirmariam que o método científico se deve a Igreja. É realmente difícil acreditar nisso visto que o criador do método (Bacon) foi perseguido por suas ideias. Após isso, o autor prossegue e vários outros pontos bem irrelevantes são levantados, como a Igreja proteger os estudantes com leis especiais por eles serem mau vistos pela população em geral por serem por vezes baderneiros. Isso é totalmente irrelevante, pois já vimos que a Igreja tinha total monopólio do ensino, é natural que ela sendo dona desse processo vá administrar as situações ao longo de seu domínio. Ele também mostra o processo de se formar, as dificuldades, o tempo de formatura, etc.. o que é igualmente irrelevante. Todas universidades ao longo da história tiveram semelhantes processos de dificuldade, o que não quer dizer nada. Algumas universidades muçulmanas por exemplo tinham um currículo de 16 anos de estudo.


Aliás, sobre Galileu, Woods passa um bom número de páginas tentando explicar seu caso, e como o problema não foi o heliocentrismo e sim a insistência de Galileu em afirmar como fato algo que ainda não podia ser comprovado. No entanto tal argumento não resiste a um questionamento bem simples: Se o problema era Galileu e não o heliocentrismo, porque outros autores heliocentristas como Copérnico, Keppler e Paolo Antonio Foscarini também foram censurados e suas obras foram parar no Index Librorum Prohibitorum por mais de 300 anos? Teria a Igreja condenado toda uma ideia por causa da arrogância de uma pessoa? Obviamente não, a Igreja não era simpática a ideia por ir contra as escrituras, e na realidade em 1616 a Inquisição se declarou oficialmente contra o heliocentrismo, e ficaram proibidas publicações sobre o tema até 1758. Após isso não significa que a vida dos pesquisadores católicos heliocentristas ficou mais fácil, os livros dos autores continuariam no Index de livros proibidos até meados do século seguinte.


Woods passa boa parte do tempo falando sobre discussões dentro da academia e sobre um suposto respeito a filosofia, a debates de lógica e etc.. tudo isso para passar uma falsa ideia de liberdade nas universidades, o que fica claro que não havia com toda censura e fatos como a proibição do ensino de direito na Universidade de Paris, ambos já citados.


Após isso ele cita um autor chamado Jaki, que argumenta que o pensamento cristão foi fundamental para o surgimento da ciência, o que já é bem questionável, mas fica ainda mais absurdo quando ele diz que culturas não cristãs não possuíam as mesmas ferramentas para produzir uma ciência sustentável e por isso sofreram um “aborto espontâneo”. Nada poderia estar mais longe da realidade, a Grécia antiga desde o Período Pré-Homérico até o Helenístico durou quase 2 mil anos, por exemplo. Não há razões para acreditar que nessas sociedades a ciência durou só um breve momento e do nada foi abortada. Muito pelo contrário, a filosofia grega foi o que levou a descobertas fantásticas para o seu tempo, sempre estiveram presentes na cultura e geraram seus frutos posteriormente, levando a fazer incríveis descobertas para seu tempo, como a descoberta da circunferência da Terra com Erastóstenes (período helenístico) , descobertas matemáticas de Pitágoras (período arcaico), a descoberta que a Terra é redonda com Aristóteles (período clássico com helenístico), o atomismo com Demócrito (período clássico) e até mesmo a teoria da evolução com Anaximandro de Mileto (período arcaico). São descobertas fantásticas demais em tempos diferentes para dizer que a ciência foi abortada, e levando em conta eles terem ainda menos recursos para tais descobertas e menos povos de influência os torna mais proeminentes e fantásticos. Qual o critério de Jaki para dizer que a ciência nesses locais foi abortada? Ao que parece ela durou muito bem por muito tempo.


A citação dele sobre o animismo é assustadoramente ridícula, pois diz que uma sociedade primitiva não desenvolveu a ciência porque imaginava que as coisas criadas tinham vida e vontade própria não podiam ser regidas por leis, e não porque são primitivos e não tem recursos nem informações o suficiente para testar a realidade! Na verdade todas alegações dele de porquê outras sociedades serem incompatíveis com o desenvolvimento de uma ciência sustentável são horríveis e igualmente simplistas. A Babilônia não o poderia porque teriam uma visão caótica demais sobre o mundo, o que não parece verdadeiro, há o mito da luta do dragão Tiamat e Marduk que deu origem a terra e as aguas e demais elementos da natureza e com o sangue do monstro derrotado produziu o homem. Qual a impossibilidade de ter conhecimento científico tendo esse mito da origem do mundo em mente? Eles não poderiam ter em mente que iriam estudar o mundo originário da luta de Tiamat e Marduk? Obviamente com o tempo esse mito seria totalmente desmentido, mas é só eles forçarem a barra para interpretar as novas descobertas com suas crenças, algo como o Big Bang ser a luta de Tiamat e Marduk. É ridículo? Talvez, mas é o mesmo modus operandi cristão para conciliar a ciência e suas crenças, porque eles não poderiam fazer também?


No caso dos chineses é interessante dizer que não há nenhum problema deles em aceitar as leis da natureza, não foi isso que levou a China a ser ultrapassada pela Europa em conhecimento científico. Nem mesmo o Needhan citado por ele diz isso, muito pelo contrário. A ciência chinesa é tão baseada na observação e experimentação da realidade que o próprio Needhan concorda e cita uma frase de um escritor árabe chamado al-Jahiz:


“O curioso é que os gregos se interessem pela teoria, mas não se preocupem com a prática, ao passo que para os chineses lhes interessa muito a prática e não lhes importa grande coisa a teoria.”


Porém a real razão da China ter ficado pra trás em relação a Europa pode de fato ter um fator cultural, e isso encontramos no próprio Needhan, mas a razão é bem diferente do que Jaki alega. Para o próprio Needhan o problema é que a China não passou por movimentos como o Iluminismo, que permitiriam quebrar com as amarras da religião e caminhar rumo a democracia. Isso fica claro em uma citação a ele no livro “China: velho e novo império” na página 34:


“A China de dinastias passadas, especialmente a Song, era superior ao resto do mundo em diversos aspectos: tecnologia, administração política, ciência. Por qual razão o modo de vida moderno não surgiu na China? Por que europeus superaram os chineses na corrida por industrialização, desenvolvimento científico, colonização e capitalismo, movimentos que deram origem ao estilo de vida moderno por todo o mundo?

O historiador e cientista britânico Joseph Needhan dedicou sua vida a responder a essa pergunta. Sua principal conclusão é que a China manteve por toda sua história elementos similares aos que durante séculos não permitiram esses mesmos avanços no Ocidente. Enquanto Europa pré-renascentista manteve-se por vários séculos sobre as amarras da religião católica, a China esteve presa aos seus rígidos hábitos confucionistas e taoístas. O resultado prático era de que o questionamento as tradições e o surgimento de novas formas de produção e organização não eram estimulados. Um exemplo dessa situação é a incapacidade de estudantes questionarem seus professores e jovens sobreporem-se aos mais velhos, características ainda vistas na China de hoje.”


Ou seja, não é que as crenças chinesas não são compatíveis com a ciência sustentada, é apenas que por uma série de razões históricas isso não aconteceu. Acemoglu em “Porque as nações fracassam” já mostrou que o processo histórico que levará uma nação a um determinado caminho e outro povo para outro é determinado por pequenas diferenças que se acumulam ao longo do tempo mais eventos externos que ele chama de situação crítica, que podem melhorar ou piorar o desenvolvimento. Um dos exemplos dele é o da Inglaterra, que sob o domínio romano conseguiu centralizar a política mas não criar um estado autortário devido a certo desinteresse romano na região e após a queda do Império romano, ela herdou instituições centralizadas que impediram a anarquia, depois disso com a peste negra houve valorização da mão de obra por essa ser reduzida, o que formou uma classe trabalhadora forte que conseguiu igualar as forças políticas com a elite e caminhar rumo a democracia, impedindo assim o surgimento de instituições que só visassem beneficiar uma pequena elite, as chamadas instituições extrativistas.


A situação crítica é a peste e as pequenas diferenças é o grau de centralização estatal com relação a outras regiões, como a França e Espanha que conseguiram formar estados um pouco mais centralizados pelo domínio romano ser maior por lá e por isso ficaram levemente mais centralizadas e tendente a instituições extrativistas que a Inglaterra, mas bem mais inclusivas se comparadas ao leste europeu e todas eles melhores que casos como a Somália, que não conseguiu criar um estado e sucumbiu a guerra eterna de clãs. A mesma coisa pode ter ocorrido na China mais que milenar, vários fatores contribuíram para a vitória das instituições extrativistas que a deixaram pra trás, mas reduzir a só a religião deles é um simplismo absurdo. Na verdade todo esse ponto da China é um bom exemplo de como é importante a laicidade estatal, se depender da Igreja Católica ou taoísmo a tendência é o subdesenvolvimento pelas instituições extrativistas que elas criam.


O caso da Grécia é tão contra sua tese que ele mal consegue argumentar, limitando-se a dizer que os gregos atribuíam um propósito aos agentes imateriais do cosmos material sem explicar porque isso seria um impeditivo para o surgimento da ciência sustentada. Na verdade, a forma que ele explicou como Aristóteles enxerga o movimento circular dos corpos celestes é devido a afeição desse tipo de corpo com esse movimento, parece bem compatível com a ideia que a interação dos corpos com características físicas gera as leis da física como já mostrei em outros posts. Por fim ao falar dos árabes ele só cospe preconceito ao dizer que o desenvolvimento da ciência deles é apesar e não por causa do Islã, o que é irrelevante pois o ponto seria mostrar porque a cultura muçulmana é incompatível com a ciência. Se ela de fato for incompatível mas os muçulmanos dão um jeito de contorna-la a explicação dele se torna bem inútil para explicar o surgimento da ciência, pois fica claro que a religião não é tão determinante assim além de que esse exemplo se volta contra ele pois é exatamente essa a situação da Europa cristã pós renascimento, com a Igreja e a religião cristã sendo contra descobertas e avanços científicos mas por ela não ter grande poder na organização social não há como impedi-los. Pra piorar essa análise está bem errada ainda, pois o Alcorão é extremamente incentivador a leitura e busca por conhecimento.


Mas o mais absurdo de tudo é ele limitar a análise a um pensamento tão simplista e esquecer o mais importante: os fatores políticos externos! Por exemplo, será que a proibição da prensa tipográfica pelo sultão otomano Bayezid II em 1485 não teve um impacto no mundo árabe na disseminação da ciência em relação ao resto do mundo? Será que a destruição e guerras dos macedônios, invasões bárbaras e o posterior domínio do império romano não teve nenhum impacto na ciência da Grécia? Ou os 5 mil anos de história da China que nesse meio sofreu com guerras, invasões mongóis e banimento do comércio ultramarino internacional por imperadores também não teve um impacto? Mas mais que isso há um sério problema em ignorar o contexto da própria Europa, que teve todo seu atraso científico já exposto anteriormente por censura da Igreja e que sobreviveu graças ao mundo protestante que era bem mais livre.


Já mostramos que ao menos na Grécia tivemos sim o surgimento de ciência formal e sustentável, mas me pergunto se o “surgimento da pesquisa científica formal e sustentável” que ele se refere de alguma forma significa o atual método científico. Se for é outro erro bem grave, pois esse só surgiu bem tardiamente no cristianismo, com Roger Bacon com o método científico só no século XI e XII, e com resistência da Igreja pois ele foi preso por isso!


Além do mais tivemos eventos como iluminismo nesse meio que negava a autoridade suprema da Igreja e revolucionou o modo de pensar para um modo bem diferente da época de domínio cristão. Por fim é curioso ver ele citando a Bíblia como instrumento instintivo para a ciência sendo que ela está cheia de erros e ao longo da história instigou o pensamento anti cientifico, seja no caso do heliocentrismo porque a Bíblia diz que a terra é o centro da Terra, seja se opondo ao atomismo, seja no caso da evolução porque a Bíblia diz que os animais vieram prontos, seja na Idade da Terra porque a Bíblia estipula que ela tem 6 mil anos, etc...


Como já falamos do heliocentrismo vou me ater agora um pouco ao atomismo e mostrar como características da crença cristã impediram o desenvolvimento do atomismo. A visão cristã de mundo é incompatível com o atomismo por dar pouca margem para intervenção divina e por ir contra a transubstanciação (transformação da hóstia em carne e sangue em vinho na santa ceia), que havia sido adotado oficialmente pela Igreja na seção XIII do Concílio de Trento, e por essa razão ele foi considerado herético e proibido pela Igreja, sendo os Jesuítas o grupo que mais lutou ativamente contra essa ideia. Por essa razão estudos sobre a partícula da luz foi desenvolvida por Newton no mundo protestante e não por um italiano que vivia na região de grande influência pela Igreja. Curiosamente um dos perpetradores dessa ideia da transubstanciação foi o aclamado pelos apologistas Tomás de Aquino.


Inclusive acredita-se que o atomismo e não o heliocentrismo foi a principal causa de conflito da Igreja contra Galileu. Em 1982, o historiador científico italiano Pietro Redondi descobriu, nos arquivos secretos do Vaticano, um documento que aparenta ser uma denúncia de heresia contra Galileu, acusando-o de endossar o atomismo. Dizia o documento:


“O atomismo não é conforme com a doutrina católica do cânone 2 da XIII sessão do Concílio de Trento. [....] Se a substância corpórea é composta de “átomos sensíveis”, isto é, se são átomos de uma substância que produzem seus efeitos sensíveis, então, dado que na eucaristia são sensíveis as aparências do pão e não as do corpo de substância do pão, como no fogo – segundo Galileu, há átomos de fogo, não a substância do corpo de Cristo, o que é falso.”

Todos esses momentos históricos demonstram a incompatibilidade da Igreja e ciência, mas pra sorte do Ocidente o fenômeno chamado iluminismo que confrontou os poderes da Igreja e questionou sua autoridade tanto política quando no campo da intelectualidade. Será que se a Igreja tivesse ainda o poder que tinha na época da Inquisição as descobertas científicas seriam tão bem recebidas assim? A verdade é que com a perda da influência da Igreja e o desenvolvimento da ciência, é comum que hoje em dia cristãos tentem assimilar a ciência e o cristianismo, nem que pra isso tentem fazer as alegações mais absurdas possíveis, mas isso se deve a uma mudança de paradigma de pensamento do iluminismo, e não algo natural do pensamento cristão. Tal simplismo de Jaki é simplesmente patético.


Como se tudo falado até então não fosse patético o suficiente ainda fica pior quando ele tenta associar o pensamento cristão a descoberta da lei da inércia, tipicamente atribuída a Isaac Newton mas para ele o idealizador seria Buridan, e mais uma vez ignora os tempos completamente distantes um do outro, passa pano para os erros de dedução de Buridan, ignora os acertos de Aristóteles e associa os erros de Aristóteles a sua crença no universo eterno e não a sei lá... Ele viver mais de mil anos antes de Buridan! Como já dito antes, considerando as ferramentas que tinham e o tempo que viviam os gregos foram os que mais contribuíram com o conhecimento, a crença em um universo eterno nunca atrapalhou isso.


> A Igreja e as artes;


Nessa parte Woods alega que a Igreja condenou o iconoclasmo, que nada mais é que ódio e destruição de imagens. Sabemos, no entanto, que no passado eles destruíram imagens e templos de deuses romanos, então novamente fica equivalente. O autor prossegue citando detalhes das construções de igrejas católicas, como as góticas. Sem tirar o mérito da beleza delas isso é totalmente irrelevante por dois motivos. Primeiro que isso é relativo, muita gente gosta e muita gente não gostaria, e segundo que literalmente todas sociedades de todos os tempos criam modelos culturais. A cultura é a manifestação de vários elementos de uma sociedade, todas fizeram construções ou algum outro elemento cultural no mínimo interessante. A arte medieval é só a manifestação da cultura dos medievais, isso não significa nem que a Igreja era boa e nem que era um período próspero. Woods parece perceber isso e do nada diz no texto que o Renascimento foi uma época de estagnação e irracionalidade, por prosperar pseudo-ciências como a alquimia, não ter grandes invenções salvo as descobertas de Copérnico e ainda ser marcado por perseguição as bruxas. Me impressiona o quanto esse sujeito gosta de tentar reescrever a história e uma análise simples o refuta. Por exemplo, sobre invenções ele não menciona mas a imprensa surge nesse período, o número de publicações de obras e o acesso delas ao público em geral se dá nessa época.


Tivemos na Renascença o melhor estudo sobre a circulação sanguínea e consequentemente o surgimento da escola iatromecânica e a administração endovenosa de medicamentos, sugerida por Carlo Fracassati (1630-1672) a partir de suas experiências, em que o efeito da medicamento injetado em animais era mais imediato e várias outras melhoras de técnicas médicas. Nessa época surgiram as seringas médicas parecidas com as atuais, nessa época surgiu o atlas de anatomia de Andreas Versalius, teorema de probabilidades de Pascal, as caravelas, órbita descoberta de cometas por Halley, luneta de Galileu Galilei, lei de gravitação universal de Isaac Newton, microscópio por Antoin Van Leeuwenhoek, moinho de vento, geometria analítica, descobertas das células por Robert Hooke e até mesmo na arte tivemos inovações como as telas de pintura e a perspectiva por arquiteto Leon Battista Alberti, além das famosas obras de Da Vinci, que vão desde pinturas a estátuas. Sobre atrocidades cometidas, é impressionante como ele esquece das cometidas na Idade Média como a Inquisição, Cruzada do Norte, Cruzada Algebiense, perseguição dos judeus durante todo esse período, destaque para as perseguições durante a primeira e segunda cruzada em Worms, Mainz, Colônia, Treves, Ratisbona e Bamberg, além da caça as bruxas que ele mesmo assume que ocorria na Idade Média. Claro que o período do Renascimento não são só flores, nessa época deu-se início as grandes navegações e com ela o que já sabemos, o colonialismo junto com todos seus horrores e a escravidão de povos ao redor do mundo. Mas no geral o saldo é bem positivo, por mais que o Sr. Woods queira negar. Vale lembrar que a Renascença foi uma fase rumo a quebrar com o antigo status quo da Idade Média e com isso evoluir a sociedade, era melhor que a antiga mas nem de longe é o ápice da sociedade que os iluministas proporcionariam. Simplesmente tem que forçar muito a barra para interpretar a história como o Sr. Woods interpreta.


Por fim, Woods tenta associar o modelo de perspectiva de alguma forma incentivado pela Igreja a revolução científica, e usa de argumento inicial a já refutada ideia que as crença cristãs favoreceriam a ciência. O argumento dele se baseia na inserção da perspectiva, curiosamente ele cita ela sendo desenvolvida na pré renascença e na renascença, ou seja tal modelo começa a ser implantado na melhor das hipóteses no fim da Idade Média, mas já vimos que ele é uma criação do Renascentismo, toda fonte associa ao renascentismo tal técnica, e usa a geometria criada por alguém da Grécia antiga para dar méritos a Igreja. Tal relação simplesmente não faz sentido, não há méritos da Igreja nesse meio.


> A Igreja e o direito;


Woods alega que a Igreja foi uma das responsáveis por criar o direito internacional, seu argumento para isso é que os índios foram protegidos por ela da escravidão na época do descobrimento da América. Na verdade o Sr. Woods parece desconhecer o que significa direito internacional e sua história nesse ponto. Direito internacional para quem não sabe não é como se fosse sinônimo de direitos humanos, na verdade se trata de jurisdições majoritariamente entre estados nacionais! Até existe o direito internacional privado que se distingue do público, mas esse atua muito mais como um juiz internacional do que um órgão de garantias de direitos humanos. A origem do direito internacional até é datada na Idade Média com o Tratado de Vestfália em 1648, só que além de não ter nada a ver com a Igreja Católica temos modelos mais antigos ainda, como os acordos entre nações desde sempre como o entre Ramesés II do Egito e Hatusil III dos hititas no século XIII a.C. Definitivamente não foi a Igreja que criou ele.


E quanto aos direitos humanos que Woods insiste em creditar a Igreja por ele? Bom, sabemos que acordos de guerra sempre existiram, reis piedosos, reis que faziam concessões aos povos dominados, proibiam barbáries, etc... Já vimos por exemplo que era comum que os romanos dessem liberdade religiosa aos povos dominados, acrescento aqui uma ordem de guerra do califa Abu Bakr, destinada a seus soldados que iriam atacar e dominar o Egito:


''Não cometam traição ou desviem do caminho correto. Não mutilem cadáveres. Não matem crianças, mulheres ou idosos. Não traga dano às árvores nem queime-as com fogo, especialmente aquelas que são frutíferas. Não matem o rebanho do inimigo, exceto para alimentarem-se. É provável que passem por pessoas que dedicaram suas vidas a serviços monásticos; deixem-nos em paz.''


Com isso, podemos entender que tal manifestação dos padres contra as atrocidades cometidas pelos espanhóis contra os indígenas é só mais uma dessas concessões de guerra que não mudam o caráter opressor da conquista espanhola. É até difícil associar esse momento com a criação dos direitos humanos já que houve proibição das crenças dos indígenas e apoio a escravidão dos negros africanos na mesma época. Sim, pois caso não saibam já mostrei no post “Cristianismo a religião da paz?” que a Igreja foi contra a escravidão dos índios, mas apoiou a dos negros africanos. Existem vários outros momentos que remontam muito mais os direitos humanos que essa concessão aos direitos dos indígenas. Antes no entanto vamos ter uma noção das bases dos direitos humanos e as suas características gerais. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), os direitos humanos são “garantias jurídicas universais que protegem indivíduos e grupos contra ações ou omissões dos governos que atentem contra a dignidade humana”. São exemplos de direitos humanos o direito à vida, direito à integridade física, direito à dignidade, entre outros.


Pois bem, será que os índios impedidos de seguir sua religião e os negros escravizados além dos massacres contra os indígenas no processo de conquista se encaixa nisso? Creio que não. Mas remontando outros períodos temos momentos históricos bem mais próximos dos direitos humanos que a conquista espanhola. Por exemplo, quando Ciro conquistou a Babilônia em 539 a.C e tivemos o Cilindro de Ciro, um escrito em um pedaço de argila que libertou todos escravos e garantiu a liberdade religiosa e racial. Bem mais próximo da ideia de direitos humanos de hoje, não? Na Inglaterra em 1215 estabeleceu coisas como o habeas corpus e o processo legal e igualdade perante a lei para todos indivíduos, a Petição de Direito de 1628 estabeleceu coisas como que a Lei Marcial não poderia ser usada em tempo de paz. A declaração da Independência dos EUA de 1776 tem grande semelhança com a declaração dos Direitos humanos de 1948, entre eles a condenação da escravidão, direito a nacionalidade, liberdade de expressão, direito a vida, direito a liberdade, direitos iguais independente de sexo, cor ou raça, liberdade religiosa, não ser preso arbitrariamente, etc... Tudo isso torna esses dois momentos bem mais próximos da declaração dos direitos humanos que a conquista espanhola das américas.


É claro que vamos encontrar algumas contradições nesse processo, como ao mesmo tempo que ocorria essas declarações da liberdade individual EUA e Inglaterra tinham escravos, no caso da Inglaterra nas colônias e os EUA pior ainda por ser em seu próprio território. Devemos lembrar no entanto que a construção do mundo que vivemos é um processo gradual, a luta contra o pensamento reacionário que vigorava na época foi feita de forma lenta, e implicou em dado momento aceitar em partes algumas injustiças para depois corrigi-las. Sempre aponto isso quando defendo o liberalismo e outras pessoas argumentam contra mim o fato de liberais terem apoiado a escravidão, e eu sempre tenho que explicar que eles receberam a escravidão de sociedades autoritárias anteriores a ele, e que em um primeiro momento o foco era combater o autoritarismo dos reis. Era preciso encarar um problema de cada vez, mas assim que foi possível eles lutaram contra e aboliram a escravidão. De qualquer forma esse não é o ponto do texto, mesmo com algumas contradições não há dúvidas que esses momentos influenciaram muito mais a formação dos direito humanos que a simples concessão de guerra aos índios.


De cara isso já refuta a citação a Francisco de Vitoria, alguém que nasceu muito tempo depois da Magna Carta. Além do mais ele é só um padre que defendeu a igualdade dos seres humanos, Woods não mostrou como sua opinião influenciou no mundo que vivia ou sequer na política da Igreja. Muito pelo contrário na verdade, as bulas Dum Diversas, Romanus Pontifex e outras deixam bem claro que aqueles que não fossem cristãos poderiam ser reduzidos a escravidão, serem mortos e ter seus bens tomados. Ao longo da história da Igreja o que se viu foi ,como já vimos, logo nas primeiras décadas de seu governo a perseguição de pagãos, e ao longo dos tempos o tratamento com os judeus foi sempre de segregação, proibindo eles de ocupar cargos públicos, proibindo de se casar com cristãos, de ter empregados cristãos e em dados momentos da história até expulsos de regiões, como foi a expulsão de judeus da Espanha, Portugal, Inglaterra em 1290, França em 1306, 1394 e 1615; na Espanha em 1492; Portugal em 1496, todos eles com amplo apoio da Igreja. Apesar da Igreja se manifestar contra a conversão forçada de judeus não havia punição para quem o fizesse e ela não poderia ser revogada. Desse modo houve várias conversões sob ameaça de morte de judeus e muçulmanos ao longo da história, como de Dagoberto na Gália, e Espanha em 1492. E após isso intensa perseguição aos convertidos, os chamados cristãos-novos, para encontrar possíveis transgressões e poder leva-los ao tribunal Inquisitorial.


O próprio São Tomás de Aquino, culpava os judeus pela perda do Santo Sepulcro, condenando-os à servidão perpétua e afirmando ser direito da Igreja dispor dos seus bens. Sobre São Tomás de Aquino e o tratamento com cristãos, esse defendia extremo controle da Igreja sobre a vida dos cristãos, sendo esses obrigados a seguir estritamente o definido pela Igreja, do contrário sofreriam sérias sanções, desde confisco de propriedade, espancamento, mutilação (vulgo tortura) até a morte. Cartaros, valdenses, hussitas e bogomilos que o digam. Tomás de Aquino se mostrava intransigente a ritos de outras religiões também:


“Os ritos, porém, de outros infiéis, que nada de verdade ou de utilidade apresentam, não devem ser tolerados a não ser para evitar algum mal; isto é, o escândalo ou o dissídio que poderiam provir ou o impedimento da salvação daqueles que, aos poucos, se tolerados, se converteriam à fé.”


Tais discriminações se estendiam até para servir de testemunhas, em que judeus, protestantes, ameríndios, negros e muçulmanos eram proibidos de servir como testemunhas em processos jurídicos, além de estudar na Universidade de Coimbra, servir em ordens militares e casar-se com cristãos velhos. Tudo isso vai diametralmente oposto a tudo pregado sobre liberdade religiosa, liberdade individual, igual tratamento independente de raça e cor, condenação da escravidão, direito a propriedade, etc... Nada a ver com os direitos humanos!


Ou seja, as atitudes da Igreja e suas políticas nada indicavam um rumo a respeitos aos direitos humanos, ao contrário por exemplo do mundo iluminista. Já falamos brevemente de algumas contradições dos iluministas, mas é inegável o quanto eles eram mais tolerantes que a Igreja Católica. Além das contribuições para a liberdade individual e da igualdade de direitos entre todos cidadãos ainda tiveram grande contribuição da liberdade religiosa, sendo esse enfatizado na Declaração de independência americana. A forma como lidavam com os judeus por exemplo Montesquieu propondo uma segregação de judeus em uma cidade fronteiriça com a Espanha, e uma contradição mas foi só isso mesmo. Ademais mesmo que Volteire, Diderot e até Rousseau já tenham demonstrado ser bastante preconceituosos com judeus sempre frisavam que eles não deveriam ser mortos nem perseguidos, o que já é um grande avanço visto o que tinha antes. Legalmente falando, a Constituição Francesa de 1791 já colocava os judeus como tendo direito a plena cidadania. Em Portugal, o também iluminista Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, ministro de D. José I, nomeado em 1750 transformou o Santo Ofício em Tribunal Régio e retirou a exigência de limpeza de sangue (não ter ascendência judaica, moura, etc...) como requisito para cargos oficiais. Sob ele desapareceu, em termos legais, o preconceito contra os cristãos-novos, judeus e mouros e denominações como a de cristão-velho foram retiradas de textos legais.


Tudo isso citado inclusive refuta o trecho em que Woods cita Aquino como se fosse um bom defensor da liberdade religiosa, o que não é verdade, e ainda quando ele cita o Concílio de Toledo em 633, que fala sobre a não conversão forçada de judeus. De fato, a Igreja sempre foi contra isso, mas não punia quem transgredisse tal ordem e nem permitia que os judeus conversos forçadamente retornassem a sua religião, sob pena de morte. Além de promover grande exclusão de direitos deles. Devemos lembrar também que provavelmente essa tolerância toda com judeus não advém do respeito a liberdade religiosa da Igreja, mas sim da extensão do direito romano, que desde sempre reconhecia o judaísmo como religio licita, o que dava certo grau de cidadania, com direitos básicos não podiam ser retirados. Além do mais o ano que ele cita está no período entre V e IX, um momento de relativa paz para os judeus na Europa Ocidental, muito devido a extensão do direito romano como acabamos de ver, e que mesmo com essa paz eram excluídos de alguns direitos públicos. Logo isso começaria a mudar e resultar legalmente no que já citamos e em vários massacres pela sociedade cristã.


Após isso, Woods prossegue e na mesma linha de raciocínio já refutada cita Las Casas, que já falamos sobre no post “Cristianismo a religião da paz?”. Trata-se de um sacerdote que lutou ativamente contra a escravidão dos indígenas. Tudo que se pode falar sobre citar ele para creditar a Igreja a construção do direitos humanos já foi falado anteriormente, só não incluí ele junto com Francisco de Vitoria porque sobre o segundo eu havia dito que mesmo ele sendo contra os abusos contra os indígenas, suas falas não surtiram efeito algum, a política católica continuou a mesma coisa. Sobre Las Casas é um pouco diferente, pois graças a sua atuação a Espanha de fato aboliu a escravidão indígena, mas ele também apesar de sua humanidade em nada contribuiu para o surgimento do direito internacional e nem dos direitos humanos. É apenas uma pequena concessão de guerra como já falamos.


Depois de citar os dois sacerdotes, Woods prossegue sobre o direito Internacional faz um pequeno prefácio de que o Estado controla a violência internamente mas ainda seria necessário um agente para controla-lo e que isso é um problema pois precisaria de alguém para controlar esse órgão também. Steven Pinker já versou sobre isso em “Os anjos bons de nossa natureza” e mostrou que de fato um governo mundial não é o ideal, mas organizações como a ONU e mais órgãos internacionais reguladores de setores econômicos se mostram eficientes em reduzir as guerras, junto do fator principal: as democracias. Mesmo elas não impedindo as pessoas em votar em pessoas más intencionadas elas limitam o quanto de dano ela pode causar. Me impressiona Woods insistir que uma micro concessão de guerra resultado de um debate interno na Espanha, sem qualquer influência ou participação de outros países teve qualquer influência sobre a criação do direito internacional. Ele realmente parece confundir direito internacional de estados e direitos humanos, e ainda está errado sobre os dois.

Ele ainda diz que por causa de dois nomes completamente desconhecidos do público em geral em um debate interno espanhol é que temos a noção do abuso cometido pelos colonizadores, e não por causa do árduo trabalho de historiadores em mostrar as chacinas ou porque somos capazes de ter empatia. Realmente a capacidade de julgamento do Sr. Woods é bem limitada.


> A Igreja e a economia;


Woods inicia sua argumentação citando contribuições dos escolásticos de Salamanca, e nesse ponto entramos na mesma questão de contribuições reais da Igreja mas que são esperadas para alguém que monopolizava o conhecimento da época e que são muito pouco para dizer que toda uma teoria econômica foi construída por ele. Escolásticos como Juan de Mariana e Martín de Azpilcueta de fato tiveram grande contribuição econômica descobrindo a oferta e demanda, por exemplo. Mas além de descobertas recentes mostrarem que na verdade o muçulmano Ibn Khaldun tenha descoberto antes, apenas descobrir a oferta e demanda é muito pouco, a ciência econômica se baseia em uma série de outros pressupostos que só seriam descobertas muito tempo depois. Dar uma contribuição não é construir a ciência econômica. Além do mais, ou eles assumem que Ibn Khaldun é o pai da oferta e demanda por ser ele quem descobriu antes ou argumentam que mesmo com o autor muçulmano tendo descoberto antes suas ideias não se perpetraram, logo a descoberta que realmente teve impacto foi dos escolásticos. Nesse caso, porém, o pai da oferta e demanda seria mesmo Adam Smith, esse sim teve grande influência na época que vivia, pois apesar das descobertas dos escolásticos, elas não tiveram grande impacto na sua sociedade e nem na economia. Tanto que só recentemente sabemos de suas descobertas.


Woods também argumenta como se a escola austríaca (EA) e seu autores fossem a base da ciência econômica, ou como se fossem o suprassumo da economia. Na verdade, está bem longe disso, a EA não é exatamente uma piada na academia, mas passa longe de estar de acordo com o atual conhecimento de economia, com várias pautas alegadas por eles sendo completamente refutadas, como a Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos (TACE), criticada até por autores liberais como Milton Friedman.


O próprio Rothbard citado por ele como um grande economista do século XX na verdade não tem relevância acadêmica quase nenhuma, até sua análise que relaciona os escolásticos como proto-austríacos está errada, sendo inclusive demonstrado que as concepções dos escolásticos não dizem respeito a nenhuma escola econômica específica dos dias atuais. Ele também está metido em polêmicas e erros crassos, como na vez que em seu livro “A grande depressão americana" ele errou em converter a taxa de inflação ao citar que a inflação entre 1921 e 1929 cresceu 61,8 % ele divide os 61,8 por 8 e disse que daria 7,7% de inflação ao ano, mas deveria usar uma progressão geométrica e não aritmética para tal, e ainda a fórmula Mf=Mi(1+g)^t e encontraria o valor de 6,2%. Certa vez manipulou dados de gastos do governo sem levar em conta a inflação para criticar o governo Reagan, fazendo ela parecer pior do que realmente era.


Ou seja, se a contribuição da Igreja foi promover a EA então podemos dizer que ela só contribuiu para uma vertente econômica marginalizada que pouco contribuiu para a economia. Felizmente para a Igreja não é bem assim, inclusive vários pressupostos da EA vão inclusive contra o que os escolásticos descobriram. É comum por exemplo que os economistas austríacos, como Mises e sua praxeologia, digam que a economia é algo imprevisível e que não pode ser estudado empiricamente, exatamente o oposto do que mostra a descoberta da oferta e demanda por Martin de Azpilcueta, que a descobriu a partir da análise na realidade:


"Assim através da experiência podemos perceber que, na França, quando a moeda é mais escassa que na Espanha, o pão, o vinho, as roupas, e o trabalho, valem muito menos. E até mesmo na Espanha, quando em tempos onde a moeda é escassa, os bens a venda, assim como o trabalho, custam muito menos do que após o descobrimento das Índias, que inundara o país com ouro e prata"


Juan de Mariana , outro escolástico idem:


"Eu passo por cima das outras desvantagens propostas - elas são mais aparentes do que verdadeiras - para lidar com maiores desvantagens, que surgem não da especulação vazia, mas são comprovadas pela experiência de tempos passados e pela memória da Antiguidade."


"Em questões sérias, não é justo promover argumentos sutis e especulativos de nossas próprias cabeças e pensamentos. Eles são freqüentemente enganosos. É melhor lutar com dados de nosso próprio tempo e de nossos ancestrais."


Tal como tudo que vimos até agora a contribuição da Igreja foi bem menor do que Woods tenta vender, e nesse caso é até pior pois ele se vangloria de terem contribuído para uma vertente econômica bem questionável. Após isso, ao citar as contribuições de Luís de Molina e Jean Olivi com o valor subjetivo, ele incorre em um erro comum dos próprios libertários de confundir valor com preço, mas como não é o objetivo desse post discutir qual vertente de interpretação do valor trabalho está correta (a marxista ou a teoria do valor subjetivo), não me desvencilharei sobre esse erro. Independente de qual esteja correto não deixa de ser uma contribuição da Igreja, tal como é uma contribuição dos protestantes independente de estar certa ou errada.


Deixando um pouco de lado as contribuições de autores isolados, quando analisamos a relação da Igreja como um todo e dos autores mais célebres dela, a relação da mesma com a economia é bem diferente do que Woods tenta passar. Para ele a Igreja e seus autores seriam uma espécie de percussores da economia de mercado, sempre ativamente incentivando o comércio e preocupados em atingir o melhor sistema econômico. Na realidade a Igreja e seus autores mais famosos como o próprio Tomás de Aquino pouco se importavam com o tema, como o próprio Schumpeter (citado por ele inclusive) mostrou:


“Constatamos [está se referindo ao século XIII] apenas pequenas indicações – um pouco de sociologia, menos ainda de economia. Tal estado de coisas era, em parte, devido à falta de interesse. Santo Tomás, em particular, interessava-se realmente por sociologia política, mas todas as questões econômicas tomadas em seu conjunto representavam menos para ele que o menos importante ponto de doutrina teológica ou filosófica; além disto, ele as considerava somente na medida em que o fenômeno econômico originasse questões de teologia ou moral.”


Assim, a Igreja e Tomás de Aquino não se importavam com a economia, pelo menos não a priori. Só falavam de economia a medida que isso de certa forma esbarrava com a teologia, moral sociologia, etc... A visão de mundo promovida pela Igreja durante o período feudal promovia o que pode se classificar como uma instituição extrativista, que Acemoglu dedicou um livro inteiro em mostrar como são a causa do subdesenvolvimento de vários países, e no caso da estagnação medieva não foi diferente. Toda a produção que já era baixa por limitações da época ainda era apropriado pelos senhores feudais e Igreja. Isso sem dúvida atrapalhou muito o desenvolvimento econômico. Como mostra Jacques Le Goff:


“A fraqueza das técnicas de produção reforçada pelos hábitos mentais condenava a economia medieval à estagnação; a satisfazer apenas a subsistência, e os gastos com produtos de luxo de uma minoria. Os obstáculos ao crescimento econômico provinham sobretudo do regime feudal, ao qual o baixo nível tecnológico estava subordinado. O sistema feudal baseia-se na apropriação pela classe senhorial – eclesiástica e laica – de todo o excedente da produção rural fornecida pela massa camponesa. Em tais condições de exploração os camponeses ficam sem meios de contribuir para o progresso econômico.”


Tal aversão ao comércio inclusive levou a migração de empresário para o mundo protestante pós a reforma. A situação em terras católicas só viria a mudar no renascimento, por volta do século XI devido a vários fatores, mas o principal sendo o renascimento do comércio, que criou a classe burguesa e os comerciantes, que conseguiram quebrar com essa ordem de mundo e retirar um pouco de poder da Igreja. Pra variar a Igreja via com péssimos olhos a ascensão da classe burguesa e o comércio, pois ameaçava seu domínio na sociedade feudal. Nas palavras do próprio Tomás de Aquino:


“O trabalho tem quatro finalidades. Primeiramente, e acima de tudo, deve assegurar o viver; segundo, deve fazer desaparecer a ociosidade, fonte de muitos males; terceiro, deve refrear a concupiscência, mortificando o corpo; quarto, ele permite dar esmolas...(...).”


Le Goff e Pirene (1964) mostraram como para o Santo todo cálculo econômico que ia além do previsto como necessário era severamente condenado, manifestando-se claramente contra o modo de vida capitalista que visa acúmulo de capital. Devemos lembrar que a usura (juros) praticado pelos judeus era abertamente condenada pela Igreja. Le Goff citou a reflexão de Tomás de Aquino sobre o assunto:


“Produzir dinheiro com dinheiro, fazer o dinheiro trabalhar sem o menor intervalo, sem levar em consideração as leis naturais fixadas por Deus, não é um pecado contra a natureza?”


Devemos lembrar também de nomes da Igreja como João Crisóstomo se manifestando contra o acúmulo de capital, Padre Valdo distribuindo as riquezas dos ricos para os pobres e os franciscanos (criados justamente no século XIII) que tinham como doutrina a negação dos bens materiais e fazer voto de pobreza. Tudo isso escancara a forma negativa como a Igreja via o comércio e o surgimento do capitalismo.


A visão negativa da Igreja em relação ao dinheiro só começaria a mudar quando os eclesiásticos começaram a se beneficiar do aumento da riqueza e passaram a fazer concessões ao comércio, a ideia do purgatório seria um indício disso. Mesmo assim era comum que a Igreja criasse as guildas com objetivo de regular a atividade econômica. É claro que a menos que você seja um ancap vai concordar que nem toda regulação é ruim, muito pelo contrário, muitas delas são mais que necessárias para florescimento do comércio. No entanto não é o caso das regulações das guildas medievais, como observa o o Prof. Sergio Noto elas serviram para gerar um extremo corporativismo:


“O verdadeiro triunfo do corporativismo ocorreu nos tempos medievais, tanto que a recuperação econômica que ocorreu nos séculos XII e XIII coincide com os primeiros exemplos de corporativismo medieval e cristão. A combinação de alguns elementos (entre os quais a visão predominantemente religiosa do mundo), a falta de poder no governo e a taxa relativamente baixa de trocas econômicas beneficiaram o desenvolvimento de uma prática corporativista econômica. (...). O corporativismo cristão medieval é uma forma de organização cujos principais objetivos eram religiosos. Abrange aspectos prático-institucionais e tem um arcabouço teórico muito sólido, baseado em uma visão orgânica da sociedade e na teoria do bonum commune”


Além das guildas havia muitos impostos, com Acemoglu apontando que só em Nassau-Usingen, no Sacro Império Romano Germânico, havia cerca de 230 impostos diferentes a quais os servos eram submetidos entre eles o dízimo de sangue que era um imposto que as pessoas deveriam pagar toda vez que um animal fosse abatido, o dízimo das abelhas e da cera, um imposto cobrado sobre cada transação de terra, cada terra que fosse comprada ou vendida deveria pagar uma taxa ao rei. Não a toa até hoje permeia no meio cristão um profundo pensamento anti capitalista devido a raiz atrelada ao modelo econômico medieval católico.


Só então, após séculos contra o livre mercado que surge a segunda escolástica, e além dos nomes citados por Woods vários outros fizeram contribuições de um pensamento liberal na economia, sendo um dos mais interessantes os jesuítas Juan de Salas (1553-1612) e Juan de Lugo (1583-1660) refletiram sobre a impossibilidade de uma intervenção positiva na economia por parte do Estado. No entanto é importante lembrar que tais descobertas se dão simultaneamente a movimentos como o iluminismo, que reduziu a influência da Igreja na sociedade e de vários outros autores que descobriam a mesma coisas mas sem a influência religiosa. Assim pouca gente soube de suas descobertas e elas pouco impactaram a sociedade, na verdade provavelmente eles foram mais influenciados por pensadores de fora da Igreja que eles influenciaram. Séculos mais trade, com o pensamento liberal já consolidado é que vai surgir as duas vertentes do Pensamento Econômico Católico, a Francesa mais liberal e a Italiana mais intervencionista (será coincidência que a italiana é mais intervencionista?).


Assim, mais do que historicamente sempre ter tido um viés anti capitalismo e anti mercado a Igreja de fato atrasou o desenvolvimento da Europa na Idade Média, de modo que não importa o quanto um ou outro autor católico tenha se mostrado favorável, a prática da Igreja praticamente só atrapalhou nesse sentido. > A Igreja e a caridade;


Esse é talvez o único ponto que em Woods talvez tenha razão, ou o mais próximo disso. A caridade e a preocupação com os mais pobres não foram criadas pela Igreja e cristãos, nem Woods alega isso é verdade. Ele cita os estoicos na Grécia antiga como exemplo de grupo que se preocupa com o social, eu cito o zoroastrismo que tem como um dos seus 7 fundamentos a caridade e generosidade para com os pobres, a primeira das 6 paramitas (ensinamentos) do budismo é a caridade, o islã tem a zakat literalmente um imposto para ajudar os mais pobres que todos devem pagar, e por aí vai.


No entanto Woods foca na análise do Ocidente, o que faz sentido pois o título do seu livro e o que ele se propõe a provar é: “Como a Igreja Católica construiu a civilização ocidental”. Nesse caso a primeira questão que me vem a mente é sobre sua alegação que nenhuma outra instituição ocidental ajudou tanto a caridade quanto a Igreja. A pergunta que me vem a mente é, com qual outra instituição ele está comparando? No período medieval a Igreja era a única grande instituição, visto a semi anarquia que se encontrava a Europa e mesmo os pequenos governos existentes eram subservientes a ela. Qual outra instituição faria a caridade que não a própria Igreja? Não faz sentido se gabar de ser a maior difusora da caridade se não há concorrência.

Woods compara com outras sociedades pré Igreja no Ocidente, e nesse caso não temos muito o que comparar. Basicamente as grandes civilizações ocidentais pré Igreja são os pagãos, a Roma e Grécia antiga. No caso dos pagãos há pouca coisa documentada, mas sabemos por exemplo de um sistema de impostos usado para financiar amparo a órfãos na Islândia Medieval chamado hreppar.


Sobre os outros dois, ele mesmo cita o estoicismo e as grandes doações por ricos, o chamado evergetismo. Além de limitar erroneamente o evergentismo a fazer grandes construções, o que é falso visto que há também a doação de alimentos e dinheiro em grande quantidade, Woods também diminui os bons atos de sociedades antigas por eles fazerem as doações esperando algo em troca, enquanto que os cristãos o fariam de bom grado. Há dois problemas com essa crítica, primeiro é que fato de os doadores não fazerem a doação com o sentimento que Woods deseja não torna menos útil. Para o pobre que passa fome e recebe comida não importa se o doador o fez de bom grado ou esperando ganhar status social. O segundo é uma visão bem enviesada dos cristãos que Woods tem, quem garante a ele que todos cristãos que doam ou mesmo a Igreja não o faz com objetivo de ganhar status social? De ser bem visto? De conter possíveis rebeliões populares? Aliás me admira vir de alguém que até a pouco falava das benesses do mercado do nada vir com um pensamento tão simplista no que tange a ajuda social e menosprezar a construção de grandes construções em detrimento de dar comida. E se essa construção for uma ponte que facilita o comércio e diminui a pobreza? Ou uma melhora no saneamento que reduz a mortalidade? Terá impacto tão positivo quanto dar comida. Era comum no evergentismo que se construísse orfanatos para crianças órfãs, isso não é tão útil quanto doar alimentos? Essa análise no fim fala mais sobre Woods do que sobre os outros povos.


Ademais o que concluímos é que sempre houve e provavelmente sempre haverá caridade, sendo a sociedade cristã ou não. Provavelmente existiria caridade em grandes níveis com ou sem cristianismo, no entanto a análise aqui não é imaginar um mundo sem cristianismo, mas suas reais contribuições. Se por uma série de razões a Igreja se manteve como a única provedora disso na Idade Média não deixa de ser mérito dela. Até que nesse ponto Woods não está tão errado.


É interessante no entanto falar sobre o tratamento da sociedade cristã aos doentes, pois ele dá vários exemplos de cristãos ajudando doentes e pobres ao passo que pagãos os saqueavam ou os deixavam morrer. Woods parece querer passar a impressão que a empatia foi inventada pelos cristãos e que ela se aplicava a todos cristãos, sendo que nenhum deles chega perto da verdade. Sobre pessoas pagãs saqueando doentes, bom, pessoas más e aproveitadoras existiram em todos povos do mundo, tal como pessoas boas que ajudavam esses pobres. Isso vale para os pagãos e até para os próprios cristãos, que longe de serem os puritanos defensores dos doentes organizaram um massacre de leprosos em 1321, acusando-os de envenenar a água das pessoas. Milhares foram mortos, e os sobreviventes condenados a viver ainda mais excluídos da população, perdendo a pouca liberdade de circulação que tinham e por vezes eram marcados com brasa quente para serem identificados em caso de fuga.


Assim, a realidade é mais complexa do que Woods tenta vender, pra variar. Por mais que concorde que a cultura cristã dá mais valor a caridade que outros povos não significa que ela dependa do cristianismo para existir ou que todos cristãos sejam caridosos.


O autor prossegue falando agora sobre a criação dos hospitais e ele mesmo admite já haver indícios que na Grécia e Roma Antiga de similares, mas que seriam muito limitados e mais focados em soldados feridos de batalha. Será verdade? Na verdade não, já haviam hospitais incipientes na Roma Antiga. e Grécia Antiga para a população em geral. Pode ter havido mérito da Igreja em dissemina-los mas não em cria-los. Além do mais é interessante notar como os romanos estavam extremamente a frente do seu tempo, já na época deles havia o que hoje é conhecido como atenção primária na saúde, que trabalha muito mais com prevenção de agravos do que com o modelo biomédico que foca em tratar a doença apenas. Esse conceito é a base da saúde pública atualmente desde a carta de Lalonde no Canadá, 1974. Os romanos preconizavam coisas como saneamento básico, tendo inclusive um eficiente sistema de esgoto, proibiam o descarte de lixo nas ruas, impediam que as pessoas fossem enterradas dentro da cidade (para isso existia um cemitério fora do território urbano), haviam as inspeções alimentícias e a fiscalização dos médicos que prestavam serviço aos cidadãos. No quesito saúde estavam bem mais avançados que os cristãos, não há dúvida, mas não é isso que se está analisando aqui e sim a caridade. Porém é interessante notar como muitas vezes o uso da razão prevalece e tem resultados bem melhores que a emoção. Os cristãos poderiam (vamos supor que tinham) a melhor das intenções e serem infinitamente mais bondosos que os romanos, mas os romanos estariam absurdamente mais saudáveis.


Por fim a última coisa que vale a pena mencionar é que na França e Inglaterra após o confisco de hospitais da Igreja e as revoluções protestantes havia menos hospitais que antes quando eram católicos. Bem, não é porque um governante não é católico que ele vai fazer tudo certo, hoje em dia a França e Inglaterra estão cheias de hospitais e continuam não ligadas a Igreja. Não é necessário a Igreja nem para cria-los e nem para mantê-los de qualquer forma.


> A Igreja e o direito Ocidental;


Nesse ponto, Woods tentará provar como as noções de direito atuais provém da Igreja, e inicia sua argumentação com mais uma completa distorção histórica, mostrando que os reis interferiam nos assuntos da Igreja, e não o contrário ou ao menos que ambos ocorriam na mesma proporção. Sabemos que durante toda a idade média e moderna a Europa é marcada pela teocracia, isso significa que Igreja e estado tinham uma relação simbiótica. A Igreja influenciava o estado e o estado a Igreja. Após isso, ele cita reformas feitas pelo Papa Gregório VII que visavam apenas impedir a interferência dos reis nas políticas da Igreja e a entende como de fato uma separação entre Igreja e estado, o que não ocorreu. Tanto que depois disso as cruzadas só eram convocadas com aval do papa, massacres a certos povos como cátaros também, e até mesmo aspectos positivos como a não conversão forçada de judeus como ele mesmo disse continuavam a ser determinados pela Igreja. E povos que estivessem sob o jugo da Igreja e quisessem sair sofreriam graves punições, como os hussitas e todas guerras religiosas na França não nos deixam mentir. A própria Dictatus Papae (documento para a reforma gregoriana) falava abertamente que a Igreja poderia depor e coroar monarcas. Enfim, não houve separação entre Igreja e Estado por Gregório VII, só houve uma pequena reforma afim de atingir os interesses da Igreja com mais facilidade.


As reformas gregorianas não se deram no sentido de separar a Igreja e o estado monárquico e cada um seguir com suas devidas competências. Na verdade se deram no sentido de subjugar os monarcas a autoridade da Igreja. Fica claro nesses trechos do próprio Gregório VII


“Que só a Igreja Romana foi fundada por Deus. Que, portanto, só o pontífice romano tem o direito de chamar-se universal. Que só ele pode depor ou estabelecer bispos. (...) Que o papa pode depor os ausentes. Que não devemos ter comunhão nem permanecer na mesma casa com aqueles que tenham sido excomungados pelo pontífice. (...) Que só ele pode usar a insígnia imperial. Que seu título é único no mundo. Que lhe é lícito depor o imperador. (...) Que o pontífice pode liberar os súditos da fidelidade a um monarca iníquo”


“Que o pontífice pode liberar os súditos da fidelidade a um monarca iníquo”


Algo que ilustra bem como isso se dá e explica o contexto da reforma gregoriana é o conflito de Henrique IV, que havia nomeado alguns bispos. Gregório excomungou os bispos nomeados por ele e alertou o monarca que ele não podia fazer isso, o que irritou Henrique IV que se negou a se submeter ao papa dali em diante. O papa então o excomungou e estabeleceu em fevereiro de 1076 a deposição de Henrique IV.


Woods segue sua argumentação, dessa vez falando de todo um sistema jurídico criado pela Igreja, desconsiderando o direito romano para a análise, fazendo apenas uma leve menção a ele já no fim do texto. Sim, pois é grande a contribuição romana nesse sentido, a própria ideia de existir uma classe de juristas profissionais e de uma ciência do direito, por meio de um processo gradual de aplicação dos métodos da filosofia grega ao direito deve-se aos romanos, como mostra José Franklin De Sousa em “Responsabilidade Civil. Na verdade uma coisa que fica claro é que com o Império Romano havia o legalismo e toda noção de direito, com a queda dele e instauração da idade Média ele é completamente esquecido por mais de 400 anos e só depois é redescoberto pela Igreja.


Tanto é que pesquisadores da área do direito tratam esse momento do século XII como o ressurgimento do Direito romano. E nem é um termo pejorativo, já que ele foi literalmente redescobertos no século XII no Norte da Itália na descoberta das obras do Corpus Juris Civilis. Novamente, até mesmo essa redescoberta foi impulsionada pela necessidade de uma nova jurisdição que pudesse atender as demandas da época, devido ao renascimento do comércio principalmente. O direito romano lidava melhor com questões como propriedade, garantindo a liberdade dos agentes econômicos em dispor livremente de seus bens e capitais e de um poder político centralizado adstrito à discricionariedade do monarca, algo semelhante ao que tínhamos na época da Dominata. As leis feudais que se baseavam os princípios da Igreja com forte viés anti mercado que já vimos não atenderiam a suas demandas.


Dado o nível de contribuição do direito romano é realmente impressionante como Woods praticamente o ignora e realmente credita a Igreja algo que ela só teve o trabalho de adaptar a nova sociedade, mas já estava criado a quase um milênio pelos romanos. Nem extremistas de direita ao falar da tal “sociedade ocidental” ignoram o direito romano, frequentemente o citando, Woods ignora-lo dessa maneira só reflete uma tentativa intencional de manipular a história em pró de uma narrativa. Woods fala sobre Santo Anselmo e a doutrina da expiação e como ela teria influenciado a conduta sobre direitos de propriedade, mas isso é irrelevante quando sabemos do ignorado por ele direito romano. Condutas sobre como agir em conflitos já existiam desde a ius civile romana.


O autor então segue dessa vez falando da origem dos direitos naturais. Segundo ele foram os decretistas que trouxeram a noção de que o indivíduo tem o direito por si independente do estado. Acontece que Woods não leva em conta em que existem várias formas de conceber o direito natural, sendo as duas que mais nos interessam o jusracionalismo e o jusnaturalismo teológico. A Igreja concebe os direitos naturais a partir do segundo, como podemos perceber em autores como Tomás de Aquino e Santo Agostinho. Para eles o ser humano tem o direito natural a partir do momento e porque são criações de Deus. Todos teriam sido feitos iguais por Deus e por isso teriam os mesmos direitos. A escola jusracionalista no entanto tem origens na Grécia antiga, e esse se baseia no direito natural comum a todos humanos mas de origem de análise da natureza, sem um deus envolvido. Com os gregos vem a primeira noção de separação entre direito natural e positivo, inclusive.


E qual a relevância disso? Bom, quando olhamos as consequências de cada uma isso fica claro. Se submetemos os direito dos humanos a vontade divina e a autoridade divina a uma pessoa, o papa no caso do cristianismo, significa que cabe a eles decidirem sobre a liberdade individual, o que as pessoas podem ou não fazer e até as punições a pessoas, além de determinar o que é crime passível de punição e o que não é. Com isso e atrelando as crenças o que temos são leis como que feiticeiros devem ser mortos, pessoas de outras religiões devem ser perseguidos e mortos, justifica guerras santas, censura a pensamento diferente, etc... Tudo é justificado por se tratar de manutenção da ordem divina. É mais fácil justificar a barbárie com esse jusnaturalismo teológico que com o jusracionalismo ou outras vertentes não teológicas de jusnaturalismo. Não a toa o direito atual é laico, aspectos religiosos não são levados em conta para definição do que é crime ou não, mas sim danos reais, quantificáveis e mensuráveis. Ou seja mesmo existindo autores católicos que prezavam pelo jusnaturalismo, o jusnaturalismo deles é teológico, por isso não é base do sistema jurídico atual e nem deve ser.


> A Igreja e a moral do Ocidente;


No seu último ponto antes da conclusão, Woods prossegue em seus argumentos, dessa vez tentando mostrar como a Igreja influencia na moral ocidental dos dias de hoje. Um desses pontos é a defesa da sacralidade da vida, segundo ele não encontrada em sociedades como Roma e Grécia antigas. O problema com esse argumento é a hipocrisia, pois ao mesmo tempo que a vida é sagrada ela pode ser tirada se a pessoa não seguir certos dogmas da Igreja, como por exemplo ser uma outra religião, ser bruxa ou homossexual, todos eram mortos na Idade Média, ou ser escravo como quando a Igreja apoiou a escravidão de negros africanos. Ou seja, a vida tem valor desde que faça o que a Igreja quer.


Após isso Woods comete talvez a maior desonestidade de todo livro, pois em tentativa de acusar outras culturas de não se importar com a vida como os cristãos ele simplesmente joga no texto, sem a menor contextualização, que Platão diz que as pessoas que a doença o consumisse e o tornasse incapaz de trabalhar deveria ser deixado morrer. Quando contextualizamos vemos que Platão tinha é uma visão muito a frente de seu tempo no que tange a bioética. Dizia ele em “A República” que doenças muito leves que o corpo trataria sozinho e doenças muito graves praticamente incuráveis (para os padrões da época) não deveriam receber tratamento, a primeira porque o próprio corpo a curaria sozinho e a segunda para não prolongar o sofrimento. Dizia ele:


“[...] se o seu corpo não é capaz de resistir, a morte liberta-o de dificuldades”


E isso está totalmente de acordo com os princípios da bioética atual, o conceito da ortotanásia trata exatamente disso. A menos que você ache que a medicina atual não dá valor a vida não há nada de errado na fala de Platão. Inclusive sua visão sobre doenças leves não serem tratadas com medicação está totalmente de acordo com a medicina atual também, mas provavelmente não pelos mesmos motivos. Platão acreditava que é porque a doença tal como a própria vida humana tem seu caminho e é só esperar que ela iria embora em breve e os médicos atuais porque pode aumentar a resistência dos patógenos.


Woods também não contextualiza a visão de Platão, que até pode e deve ser questionada em alguns pontos mas em momento algum aponta para uma não valorização da vida. Quando ele fala que se a doença o impede de trabalhar ele não deveria receber tratamento e deixado morrer devemos considerar que ele vivia na Grécia antiga, na época tanto o trabalho quanto a participação na vida pública eram temas fundamentais na vida do indivíduo, o sujeito só se sentiria completo se participasse da vida pública e realizasse seu ofício. Apesar de bem questionável se a pessoa tem que ser deixado para morrer por isso, novamente Platão demonstra uma visão de saúde muito a frente do seu tempo, claramente ele entende a saúde em sua completude, não considerando como o velho conceito biomédico que entende saúde apenas como ausência de doença mas sim como o atual conceito da OMS: “estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas como a ausência de doença ou enfermidade”.

Ou seja, podemos (diria até que devemos) discordar que pessoas que não podem trabalhar consumidas por doenças devem ser deixadas para morrer (salvo se estiverem sofrendo muito por ela), mas dizer que não havia valorização da vida por Platão por isso é completamente errado.


Ele diz que Sêneca disse que crianças débeis e anormais devem ser afogadas, e se esquece que o tratamento com doentes e deficientes na Europa cristã apesar de ter algum avanço com relação a sociedades como Esparta também não era dos melhores. Há relatos que doentes mentais eram vistos como endemoniados e acabaram sendo queimados pela Inquisição. Os deficientes recebiam tratamento dúbio, ora eram dignos de misericórdia e ora eram marginalizados, pois a religião cristã ao colocar o homem como ‘imagem e semelhança de Deus’, ser perfeito, inculcava a ideia da condição humana como incluindo perfeição física e mental. E não sendo ‘parecidos com Deus’, os portadores de deficiência (ou imperfeições) eram postos à margem da condição humana. Ou seja, dizer que a Igreja Católica nunca aceitou semelhante comportamento é simplesmente falso.


Ele volta a criticar os estoicos por serem a favor do suicídio como forma de fugir do sofrimento, o que na verdade não é bem assim. O estoicismo defende a total apatia com relação a sentimentos destrutivos, assim eles não defendem que qualquer um a qualquer momento que estiver infeliz deve se matar, mas sim que em ultimo caso quando ele entender que sua jornada chegou ao fim.


Ainda sim não é justificável, mas de novo não há um desprezo pela vida como Woods tenta pregar. Para piorar ele mesmo cita pessoas na Antiguidade, como Aristóteles, que eram contra o suicídio, ou seja, não é algo amplamente difundido no mundo antigo. O autor dá tanta ênfase na questão do suicídio que apresenta um dado sobre a grande discrepância entre as taxas de suicídio entre os cantões católicos da Suíça e os cantões protestantes, sem apresentar nenhum dado de fato, e ainda cita as baixas taxas de suicídio na Irlanda católica apesar de ser uma terra de tantos infortúnios.


Curiosamente quando pesquisamos os dados de fato percebemos que a Irlanda tinha em 2017 uma taxa de suicídio de 8.37/100 suicídios/100 mil habitantes enquanto o Reino Unido protestante de 7.36 suicídios/100 mil habitantes. O país com a maior taxa de suicídios no mesmo ano é a Lituânia, com 27.99 suicídios/100 mil habitantes, com 75% de católicos (a terceira maior da Europa) e o com menor era a Grécia, com 3.51 suicídios/100 mil habitantes e 0% da população se declarando católica. É claro que a discussão sobre essas taxas não pode se limitar a exemplos isolados e nem ignorar o maior fator sobre suicídio: as condições de vida das pessoas. Não podemos ignorar como o fator pobreza em países como Rússia, Albânia, Sérvia e Macedônia impacta nas taxas. Por isso se quisermos chegar a alguma conclusão séria devemos levar em conta as condições sociais de cada país, e separar em grupos de países parecidos em renda e IDH. Quando fazemos isso temos o seguinte resultado:






Agora comparando por IDH:





Como vemos a relação (R²) entre eles é muito baixa, atingindo no máximo um ~0,20, indicando não haver qualquer relação entre a população católica e taxas de suicídio. Assim, se a Igreja Católica de fato criou uma moral anti suicídio isso se mostra irrelevante na prática.


O Sr. Woods diz que as arenas de gladiadores do Império Romano em que pessoas lutavam até a morte são uma prova do descaso com a vida dos povos antigos, mas sabemos hoje que a morte de gladiadores era algo raro, normalmente era mais comum que um deles se rendesse e saísse vivo. Além dos mais, eventos que envolvem violência como entretenimento são extremamente comuns entre praticamente todos povos do mundo, inclusive os católicos. Entre esses temos as justas e ordálias. Novamente o Sr. Woods doura a pílula cristã e não mede esforços para tentar diminuir outros povos. O autor diz que a Igreja foi contra duelos e vinganças entre as pessoas, preferindo julgamentos para resolver as diferenças, o que é verdade já que inclusive ela se manifestava contra as já citadas ordálias. Porém há relatos de participação dos membros da Igreja para atestar a inocência do vencedor.


Woods então fala sobre as guerras justas, e como autores como Tomás de Aquino tentaram criar critérios para legitimar guerras e evitar guerras por motivos pessoas dos monarcas. Como ele mesmo aponta em seu livro, vários outros povos na história tentaram racionalizar sobre a guerra justa, mas ele alega que os padres lhe deram extensão mais ambiciosa. Isso não parece ser verdade quando olhamos os vagos critérios citados por ele como o de Aquino e Santo Agostinho.


Porém se repararmos os critérios citados por Aquino e Santo Agostinho não trazem nada de novo e são muito subjetivos, são coisas do tipo: “Só o soberano pode iniciar uma guerra...”, ora já existiu alguma sociedade que qualquer indivíduo da sociedade e não apenas seu líder pode iniciar guerra? Outro critério vago é dizer que guerra justa é aquela que visa restituir o que foi injustamente roubado (existe roubo justo?) e para evitar o mal, existiu alguém que defendeu abertamente o mal? Mesmo aqueles claramente do lado errado da história clamam estar fazendo o bem. Outro citado por ele é Francisco de Vitória que apenas diz que os reis devem tentar viver em paz e não se vangloriar de suas vitórias mas ter humildade cristã, o primeiro item definitivamente vago pois ninguém prega abertamente que quer viver em guerra e o segundo nem se refere a um critério de guerra justa. Francisco de Vitória no entanto fala sobre não dirigir ataques as populações mas apenas as forças militares com o objetivo de tomar o inimigo.


No entanto tal como no caso dos direitos do índios a voz de Francisco de Vitória era apenas uma dissidente, na prática na mesma época o que víamos da Igreja eram publicações como essa na Dum Diversas:


“... nós lhe concedemos, por estes presentes documentos, com nossa autoridade apostólica, plena e livre permissão de invadir, buscar, capturar e subjugar os sarracenos e pagãos e quaisquer outros incrédulos e inimigos de cristo, onde quer que estejam, como também seus reinos, ducados, condados, principados e outras propriedades... e reduzir suas pessoas à perpétua escravidão, e apropriar e converter em seu uso e proveito e de seus sucessores, os reis de Portugal, em perpétuo, os supramencionados reinos, ducados, condados, principados e outras propriedades, possessões e bens semelhantes...”


Os apologistas sabem dessa passagem e tentam contextualiza-la falando sobre invasões muçulmanas, contexto de guerra, o que já foi amplamente refutado no texto “Cristianismo religião da paz?”. Curioso também como Woods alterna entre citar a posição oficial da Igreja com a fala de um padre quando lhe convém. Será que ele considera as ações de padres nas justas e ordálias como provas que o cristianismo cooptou com elas? Ou nesse caso só vale a visão oficial da Igreja? E será que ele considera que a Igreja apoiou a escravidão pela Romanus Pontifex? Ou nesse caso só vale a fala do Las Casas? Woods precisa se decidir.


Além de ser pouco objetiva, as falas de Aquino e Santo Agostinho não refletiram a realidade da época. Justamente por serem critérios pouco objetivos ser comum que houvesse guerras a quase todo momento, como mostrou Steven Pinker em “Os anjos bons de nossa natureza. No mesmo livro é mostrado que entre 900 e 1400 houveram 1148 guerras, uma média de 2.29 por ano. Para feito de comparação de 1400 até 2011 (quando o livro foi publicado) tivemos 1166 guerras, com uma média de 1.90 por ano. Já vimos vários massacres iniciados pela Igreja contra cátaros, valdenses, hussitas, cruzada do norte, etc... Só esses fatos quebram tanto a ideia de uma Igreja que respeita a vida quanto que evitaria guerras injustas. Woods critica Maquiavel por esse defender um estado soberano, mas esquece que a Igreja é contra isso porque ela quer ser a soberana! Não por um princípio de limitação de poder.


Após isso, Woods cita o tratamento das mulheres no cristianismo, sendo boa parte de seu argumento destinado a castidade, como se a liberdade sexual da mulher fosse algo ruim. Não que eu esteja apoiando traição no casamento ou algo assim, no entanto é esse super controle da sexualidade feminina que vai levar a anos de opressão as mulheres e exclusão de vários direitos básicos. Já vimos brevemente que quando o assunto é o tratamento das mulheres o cristianismo não se mostra necessariamente inclusivo, algo demonstrado pela discrepância entre alfabetização entre homens e mulheres na Idade Média. O Brasil um país majoritariamente cristão e sempre se baseando em moral cristã para pautar sua organização social só criou primeira lei permitindo estudo em escolas primárias das mulheres em 1827 , o direito ao voto feminino só em 1932 , o direito de trabalhar fora sem autorização do marido só em 1962, e várias outras. Em várias sociedades cristãs as mulheres sequer podiam usar roupas de banho curtas.

A própria formação da igreja católica permitindo a apenas homens ocupar os mais altos cargos como papa e bispos demonstra uma cultura enraizadamente machista na moral cristã, além da forma que sempre relata ela como fonte de pecado em praticamente toda a bíblia e em autores cristãos. Tudo bem que o voto feminino não é algo recente apenas em países de maioria católica, mas de regra países de maioria protestante forneceram esse direito básico antes dos católicos, como o Reino Unido em 1918, EUA em 1920, Alemanha em 1918 e em casos mais extremados a Austrália em 1902 e Nova Zelândia em 1893! Países católicos só forneceram tal direito anos depois como a Itália em 1945, Portugal e Espanha em 1931 e toda América Latina praticamente se dando na década de 30 e 40.


Inclusive já que Woods gosta tanto de citar frases de autores isolados, o que ele teria a dizer sobre essas frases de católicos famosos:


“Mulheres não deveriam ser educadas ou ensinadas de nenhum modo. Deveriam, na verdade, ser segregadas já que são causa de horrendas e involuntárias ereções em santos homens.”

Santo Agostinho


“É Eva, a tentadora, que devemos ver em toda mulher. Não consigo ver que utilidade a mulher tem para o homem, tirando a função de ter filhos.”

Santo Agostinho de Hipona, pai da Igreja


“A mulher é uma ferramenta de Satã e um caminho para o Inferno.”

São Jerônimo


“Para a boa ordem da família humana, uns terão que ser governados por outros mais sábios que aqueles; daí a mulher, mais fraca quanto ao vigor da alma e força corporal, estar sujeita por natureza ao homem, em quem a razão predomina.”

Tomás de Aquino


“A mulher é um ser acidental e falho. Seu destino é viver sob a tutela do homem. Sobre si mesma ela não tem autoridade alguma. Por natureza a mulher é inferior ao homem em força e dignidade, e por natureza lhe está sujeita, pois no homem o que domina, pela sua própria natureza, é a facilidade de discernir, a inteligência.”

Tomás de Aquino


Isso refuta o argumento de um cristianismo inclusivo com as mulheres. Isso linka com seu último ponto antes da conclusão que é quando ele fala sobre as virtudes católicas na sociedade ocidental, que ele se contradiz ao dizer que filósofos gregos já falavam sobre isso e depois que a Igreja Católica introduziu na sociedade ocidental. Sobre as tais virtudes, isso é muito relativo, da mesma forma que ensina a não matar e não roubar, também ensina a perseguir e subjugar os infiéis, ser homofóbico e machista além de legitimar barbáries como a legitimação da escravidão. A sociedade está indiscutivelmente superior do ponto de vista moral e isso se deve a renegar valores cristãos e questionar a autoridade da Igreja. Assim é bem questionável até que ponto essas virtudes da Igreja fizeram bem a sociedade.


> Conclusão


Na sua conclusão, Woods apenas reafirma com base em todo seu raciocínio falho que a Igreja construiu a civilização ocidental, o que como vimos não pode estar mais longe da realidade. Farei aqui uma síntese de tudo que já vimos e minha conclusão com base em tudo que foi apresentado.


A alegação que a Igreja católica contribuiu de maneira decisiva para a civilização ocidental prosperar é simplesmente falsa. Conseguimos citar mais momentos em que ela atrapalhou o desenvolvimento, seja ele econômico ou social, e mensurar de forma objetiva. Para demonstrar isso iremos nos apegar sobre os supostos 8 áreas do conhecimento que são fundamentais para o florescimento de qualquer sociedade e que a Igreja supostamente teria dado contribuição decisiva.


1- Aumentou e muito a importância dada a caridade.


Esse e o próximo ponto serão os únicos que podemos concordar como de fato uma contribuição da Igreja, mas com ressalvas, pois a caridade existe em várias sociedades até prévias ao cristianismo e até em volumes maiores. É difícil imaginar que sem a Igreja não haveria caridade ou uma caridade em grandes níveis.


2- Justamente por isso criou os hospitais e outras instituições de saúde.


Na verdade os hospitais já existiam desde a Grécia antiga, com as limitações tecnológicas da época é verdade, mas existiam. Sobre contribuição em geral na saúde os romanos e gregos contribuíram muito mais, tanto por técnicas de medicina, como discussões sobre bioética e também contribuições na área de promoção da saúde. Os romanos já tinham a noção de que prevenir agravos de saúde é melhor do que focar na doença, algo que só viria a ser redescoberto como política pública, na década de 70 pelas sociedades atuais mas já preconizado pelos romanos a milênios. Eles investiam em esgotos, proibiam o descarte de lixo nas ruas, impediam que as pessoas fossem enterradas dentro da cidade (para isso existia um cemitério fora do território urbano), haviam as inspeções alimentícias e a fiscalização dos médicos que prestavam serviço aos cidadãos. Até os árabes com seu conhecimento em medicina muito superior na Idade Média contribuíram mais que a Igreja nesse sentido. O mérito da Igreja está em algumas pequenas descobertas e disseminar os hospitais. Ou seja um mérito bem menor que os apologistas vendem.


3- Também por isso contribuiu decisivamente para o combate a escravidão, a opressão das mulheres, das crianças, dos doentes e dos trabalhadores. Categorias consideradas "inferiores" no mundo antigo.


Essa é piada. A Igreja apoiou a escravidão com a Dum Diversas, Romanus Pontifex e outras bulas. Não só ela não lutou contra a escravidão como tinha escravos! A base dos apologistas para negar que a Igreja apoiou a escravidão são bulas para populações bem específicas, como uma que condena a escravidão nas Canárias e outra na Etiópia (por ela ser cristã) e a condenação a escravidão dos índios. Mas dos negros africanos ela apoiou sim, isso não há como negar. A luta contra a opressão de mulheres é mais piada ainda, a maioria dos países católicos no passado antes da revolução por direitos era marcado por exclusão dos direitos básicos para mulheres, como trabalhar fora sem permissão do marido (no Brasil essa lei só veio em 1962, por exemplo), estudar, divorciar e votar. Não a toa os níveis de analfabetismo feminino sempre foram bem maiores que o masculino em sociedades católicas. Sobre as crianças, tirando Esparta e outras poucas sociedades, institucionalmente a Igreja sempre tratou as crianças na média como outras sociedades, nada de especial.


4- Contribuiu decisivamente com o desenvolvimento da ciência.


Essa é a maior mentira de todas. A história da Igreja com a ciência sempre foi dúbia, não a odiava a priori mas só a aceitava a medida que não fosse contra seus dogmas. A controvérsia com 0 heliocentrismo e atomismo mostram isso. Os apologistas sabem dessas controvérsias e tratam de inventar desculpas que não se sustentam com o mínimo de análise histórica. Por exemplo, dizem que o problema não foi o heliocentrismo e sim a insistência de Galileu em afirmar como fato algo que ainda não podia ser comprovado. No entanto tal argumento não resiste a um questionamento bem simples: Se o problema era Galileu e não o heliocentrismo, porque outros autores heliocentristas como Copérnico, Keppler e Paolo Antonio Foscarini também foram censurados e suas obras foram parar no Index Librorum Prohibitorum por mais de 300 anos? Teria a Igreja condenado toda uma ideia por causa da arrogância de uma pessoa? Obviamente não, a Igreja não era simpática a ideia por ir contra as escrituras, e na realidade em 1616 a Inquisição se declarou oficialmente contra o heliocentrismo, e ficaram proibidas publicações sobre o tema até 1758 e só seria retirado do Index de livros proibidos no século seguinte.


Curiosamente eles não dizem nada sobre o atomismo, mas esse foi ativamente perseguido e censurado pela Igreja como o livro de Nicholas de Autrecourt em 1346, além de vários jesuítas de renome como Antonio Vieira, Silvestre Aranha e Orazio Grassi, além de ele ser banido das escolas jesuítas em 1746 e livros sobre o tema colocados no index de livros proibidos. Ainda sobre a ciência, a censura imposta pela Igreja reduziu o número de publicações acadêmicas em 30%, o que além de atrasar a ciência reduziu o capital humano e foi uma das causas do declínio da Itália em relação ao mundo protestante. Sabemos também que mesmo quando não havia censura de fato a Igreja fazia todo um processo de averiguação dos livros, o que atrasava suas publicações em décadas. Tudo isso reduziu atrapalhou muito a ciência e as pequenas contribuições não são capazes de superar isso, pois elas são muito mais fruto da Igreja monopolizar o conhecimento da época. Então não, definitivamente a Igreja não contribuiu para a ciência.


5- Justamente por isso criou dezenas de Universidades ainda na Idade Média.


Na verdade as universidades surgiram muito mais por uma necessidade econômica que por movimentação da Igreja para tal, mas tecnicamente sim ela fundou. Mas elas eram super controladas pela Igreja e houve vários momentos de censura a estudo de direito civil e aristotelismo. Além de claro a censura aos autores que iam contra suas concepções já mencionados. Cerca de 12% dos conteúdos de ciências e 5% dos conteúdos de medicina eram censurados, o que pode parecer pouco se comparado aos mais de 50% das obras de humanidades mas mostra que havia forte perseguição ao intelecto na época.


6- Contribuiu com o desenvolvimento da noção de liberdade de consciência e religiosa, o que seria os primórdios das noções modernas de Direito Internacional e Direitos Humanos. Mas nesta área teve a valiosa ajuda de certos ramos do Protestantismo e do Iluminismo.


Simplesmente falso. Não sei quais argumentos está se baseando mas se forem os de Woods é simplesmente mentira. Para se basear nisso Woods se baseia na controvérsia de Vallalloid, em que alguns padres como Las Casas argumentaram contra a escravidão dos índios. Não teve qualquer participação de outros países e foi um movimento interno da Espanha na qual ninguém tem conhecimento. Simplesmente não tem nada a ver com direito internacional que se refere a relações de estados e sempre existiu na história da humanidade. Sobre os direitos humanos a ideia é mais falsa ainda, já que literalmente a Igreja apoiou a escravidão dos negros, tratamento extremamente discriminatório como judeus, legalmente proibir outras religiões em seus domínios, perseguição de morte de grupos heréticos como cátaros, bruxas e homossexuais, além de claro promover guerras. Tudo isso fere tantos direitos humanos que nem dá pra contar. Além de fazer tais coisas a Igreja ainda tinha aval de importantes pensadores para promover tais atos, como Tomás de Aquino. E não foi uma pequena contribuição de Iluminismo e Protestantismo, se é que houve qualquer contribuição da Igreja ela que foi mínima, o protestantismo teve influência mediana e quem definiu definitivamente para tal foi o Iluminismo. E não vamos esquecer do direito romano, que também foi fundamental nessa história.

7- Deu contribuições para o desenvolvimento da economia. Mas mais uma vez nesta área teve a ajuda de certos ramos do Protestantismo e do Iluminismo.


Esse é forte candidato ao mais falso de todos, pois a Igreja nunca se importou com a economia e durante a Idade Média promoveu instituições extrativistas em que os servos tinham sua já baixa produção pilhada pelos nobres e Igreja. Com o florescimento do comércio a Igreja viu isso com maus olhos e sempre foi contra por esse abalar sua autoridade. Depois quando finalmente aceitou em partes o mercado ainda promoveu guildas corporativistas que atrapalharam ainda mais o mercado. Contribuições teóricas como a oferta e demanda devem muito pouco aos escolásticos, já que já havia sido descoberta antes por Ibn Khauldun e nem influenciaram seu tempo. Mais uma vez fica claro que a Igreja contribuiu negativamente para a economia, pois já tínhamos visto que a censura levou ao declínio da Itália.

8- Contribuições importantes na área da arte em geral, sobretudo literatura, pintura e arquitetura.


Irrelevante, a arte é só a manifestação cultural dos povos, apreciamos a que existe mas se as condições fossem diferentes e houvesse outro tipo de arte essa seria a que apreciaríamos.


Com tudo que foi dito fica claro uma coisa: A Igreja não criou a civilização Ocidental! Na verdade ela mais atrapalhou que ajudou, o período que ela foi mais influente na verdade foi marcado por um período de perseguições, estagnação econômica, censura e declínio. O termo Idade das Trevas hoje tido como exagerado não está totalmente errado, já que de fato foi um período de estagnação, no entanto os efeitos corrosivos da teocracia cristã na Idade Média foram sentido até bem depois da Idade Média. Quem de fato construiu a civilização ocidental, então? Bom, ignorando a problemática desse termo, a resposta é simples: Gregos, Romanos e os iluministas. Graças a eles a civilização do ocidente conseguiu promover instituições inclusivas que propiciaram o desenvolvimento. Seja no desenvolvimento da democracia, do direito romano, o questionamento da autoridade da Igreja e monarcas absolutistas, os ideais de liberdade e uso da razão para descobrir o universo. Isso de fato quase não existiu em outras civilizações, marcadas por regimes autocráticos. Joseph Needhan, historiador inglês, por exemplo, apontou que a China tinha tudo para despontar como a maior potência como fez a Europa, mas devido a estar presa em rígidos hábitos confucionistas e taoístas acabou não conseguindo. Ele inclusive faz o paralelo entre a Europa Medieval e a China, ambas presas as amarras de regimes autocratas e teocráticos acabaram não se desenvolvendo. Faz-se necessário esse tipo de reflexão pela famosa frase que ao estudar história aprendemos a não repetir os erros do passado, e combater grupos fundamentalistas religiosos que sempre estão do lado errado da história, levando a regressão econômica e social, ao impor seus valores retrógrados sobre indivíduos pacíficos e impedir a liberdade. Se queremos nos manter no ritmo gradual de evolução da sociedade observada nos últimos séculos. Estudar história é importante, pois com ela o caminho para a prosperidade fica bem evidente, e é algo completamente oposto ao que querem os fundamentalistas.


No mais é isso, e até o próximo post!



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